30 nov 2004 - 21h36

Tal pai, tal filho

O zagueiro prata-da-casa Marcão defendeu a zaga do Atlético por quatro temporadas, divididas em duas passagens. Conquistou os Campeonatos Paranaenses de 85 e 88, além da Seletiva para a Libertadores em 1999. Como jogador, também teve o privilégio de estar em campo na primeira partida da Arena da Baixada, contra o Cerro Porteño. Uma carreira vitoriosa como atleta e, fora de campo, como pai. O futebol não é genético – vide o clássico exemplo de Pelé, que não conseguiu transferir para nenhum de seus filhos a genialidade que tinha com os pés. Porém, no caso de Marcão, a ciência abriu um bom precedente. Assim como ele, seu filho também se chama Marcão, também é zagueiro e também começa a carreira com a camisa atleticana.

Mas os dois não são iguais em tudo. "Ele é muito mais técnico", confessa Marcão pai, com humildade. "Foi ele quem me ensinou tudo o que sei", devolve o filho, com gratidão. Em termos de orgulho, os dois empatam. O filho, como não poderia deixar de ser, deixa claro que o pai é seu maior ídolo e mestre. Além dos conselhos sobre a condução da carreira, Marcão gosta de assistir a fitas com jogos do pai para se inspirar.

Já Marcão pai não consegue esconder a satisfação pelo sucesso do filho. A convocação para a Seleção Brasileira Sub-17, na última semana, foi um prêmio para todos que acompanham a trajetória de dez anos de Marcão filho no futebol. Começou aos 6 anos no futsal e já jogou nos times mirins do Inter e do Vasco, antes de chegar ao Atlético em 2001. O começo foi difícil. O pai revela que cometeu excessos na ânsia de ver o sucesso do filho. "Eu cometi esse erro de cobrar demais da criança, isso está errado. Eu via que era um peso muito grande para ele", diz. Mas nem isso atrapalhou a trajetória do filho. Desde que chegou ao Furacão, em 2001, ele só atravessou bons momentos.

Toda a família se mudou para Curitiba por sua causa. Conciliando as rotinas dos treinamentos e dos jogos com os estudos, Marcão vai planejando um futuro de sucesso. Traz de casa a experiência necessária para não cometer erros na carreira. "O jogador que está começando tem de descansar bastante, tem de se alimentar direito. Às vezes, detalhes assim influenciam", diz, com sabedoria rara para um garoto de 16 anos.

Titular do time de juvenis do Atlético e recém-convocado para a Seleção Brasileira, ele sonha agora com vôos mais altos. Quer se profissionalizar no Atlético e jogar na Arena da Baixada, para repetir outro passo da trajetória de seu pai. Depois, imagina-se em um clube europeu e, claro, na Seleção Brasileira principal. Tudo isso, é claro, com o apoio do pai, que nunca lhe faltou. Confira a entrevista exclusiva que os dois concederam à Furacao.com:

Como você começou a jogar?
Marcão (filho): Eu acho que quando o brasileiro nasce para ser jogador, desde pequeno ele já tem isso na cabeça. Eu sempre gostei de futebol e pela influência do meu pai, me interessei mais ainda. O meio em que eu vivia também contribuiu, sempre cercado dos amigos do meu pai. Os meus amigos também elogiavam o meu pai e isso me orgulhava. Então, meu sonho era ser jogador de futebol. Eu comecei a jogar bola com 5 anos.

Você lembra do seu pai jogando?
F: Lembro, eu assisti a vários jogos dele.

Marcão, você jogou até que ano?
Marcão (pai): Eu joguei até 2000. Comecei no Atlético, em 85 e fiquei aqui até 88. Depois, fui para o Guarani, Santa Cruz, Mogi Mirim, Paraná Clube, Inter de Porto Alegre e futebol japonês. De lá, eu voltei para o Inter, passei pela Inter de Limeira, Brasil de Pelotas e aí voltei para o Atlético, em 99. Eu tive o privilégio de inaugurar a Arena, de participar do primeiro jogo.

Quando você mudava de time, sua família ia junto?
P: Ia junto comigo e o processo era sempre o mesmo: a gente colocava o Marcão na escolinha do time. Ele ia se destacando até conseguir um lugar no time. Ele passou pelo Internacional e pelo Vasco da Gama antes de vir para o Atlético.

Você sofreu muito por ter de mudar de cidade cada vez que seu pai era contratado por um time?
F: A minha maior dificuldade foi em relação a amizades. Quando eu começava a ter novos amigos, aí a gente já viajava de novo e tinha de fazer outros amigos. Além disso, tem de se acostumar a falar outra língua, outro clima, outro apartamento, outro método de ensino. Era chato, mas por outro lado era gratificante por eu ver meu pai jogando. É muito difícil, não é todo mundo que agüenta.

Como você foi parar no Vasco, Marcão?
F: Eu disputei um torneio no interior do Rio de Janeiro pelo time de Santo Antônio de Pádua, cidade onde meu pai nasceu. Meu pai nem sabia disso e um olheiro do Vasco me observou. No mesmo dia, ligaram para ele para que eu fosse jogar no Vasco. Eles nem sabiam de quem eu era filho, então fui eu mesmo que ralei. Daí eu fui para o Vasco, fiquei um período em testes lá e fui aprovado para jogar no mirim.

Como foi a sua chegada no Atlético?
F: Eu tinha 12 anos, estava no mirim do Vasco, mas no final do ano eu resolvi sair. Eu morava no alojamento, ficava longe da família o ano todo, raramente ia para casa. Eu não agüentei e pedi para ir embora. Depois a gente veio passar férias em Curitiba e eu acabei fazendo um teste no Atlético. Fiquei quase um mês sendo observado pelo Orlandinho e acabei ficando.

Por que você escolheu o Atlético para indicar ao seu filho?
P: As amizades minhas eram mais do Atlético. Eu era muito amigo do Flávio, ele era como um irmão, não saía lá de casa. Um dia nós fomos assistir a um jogo do Atlético na Arena e na saída do jogo, encontramos o Vinícius ( Eutrópio ). O Flávio, que até tem um pouco de participação nessa história, me apresentou ao Vinícius e eu falei para ele que meu filho estava jogando no Vasco. Então ele falou para o Marcão ir fazer um teste. Nessa época, eu estava morando no Rio ainda e não estava retornando para Curitiba, mas acabamos ficando por aqui.

O começo da carreira de jogador de futebol geralmente é difícil. Como foi no caso do Marcão?
P: No começo, foi muito difícil. Eu jogava no Paraná e a gente treinava no Boqueirão. Acabava o treino e eu ia até o Bacacheri, onde a gente morava, pegava o Marcão e vinha trazê-lo até o Curitibano. A gente não era sócio do clube, mas um médico do Paraná conseguiu a liberação para o Marcão jogar lá. Na volta dos treinos, eu vinha dando aqueles puxões de orelha nele. Como eu ainda estava na ativa e jogando bem, eu exigia muito dele. É até um conselho que eu dou aos pais que têm filhos na escolinha. Eu cometi esse erro de cobrar demais da criança, isso está errado. Claro que eu não apelava de chegar a xingar, mas eu cobrava muito e via que era um peso muito grande para ele. Às vezes um jogador profissional demora anos para aprender alguma coisa e tem outros que nem têm todos os fundamentos. E eu queria que ele tivesse os fundamentos completos. Então, eu errei muito no início.

Marcão, você nunca chegou a pensar de desistir de tudo em função da cobrança?
F: Já. No começo, quando eu jogava no Vasco eu cheguei a pensar. Por eu ser novo e por estar saindo de casa pela primeira vez, eu não consegui me acostumar. O pessoal do Vasco me tratava muito bem, mas eu não agüentei ficar sozinho. Depois, quando eu vim para o Atlético, minha mãe não quis me deixar morando sozinho e eles mudaram para cá.

Você já sentiu alguma cobrança externa por ser filho de um ex-jogador famoso?
F: Não. Eu procuro sempre me esforçar nos treinos, nos jogos e meus companheiros e os torcedores que vêm assistir aos jogos reconhecem isso. Muitas vezes eles nem sabem que sou filho do Marcão. Eles só descobrem pelo meu jeito de jogar, pelo meu esforço. Às vezes, isso nem vem à tona, não é algo muito falado.

Marcão diz que não sofre pressão por ser filho de
um ex-jogador

Você sempre foi zagueiro?
F: Quando eu joguei no Inter de Porto Alegre, eu era lateral-direita, jogava de volante às vezes. Aqui no Atlético eu também joguei de volante também. Mas eu gosto mesmo é de jogar de zagueiro.

Como é sua rotina de treinos?
F: A gente treina quase todos os dias. Normalmente tem uma folga num dia à tarde. Mas a gente treina de manhã e à tarde e estuda à noite. Durante a semana, eu quase nem vejo a minha família porque saio de manhã para treinar e só volto depois da aula, quase 23 horas. É bem pesado. Aqui a gente trabalha bastante e o resultado está aí: o profissional em primeiro lugar, júnior, juvenil e infantil todos na semifinal.

Você não teme que haja uma pressão muito grande quando você for para o profissional?
F: Não, de jeito nenhum. Desde pequeno eu tenho orgulho do meu pai e ele é o meu maior espelho. Eu sou zagueiro também e procuro sempre me inspirar nele. Eu vejo fitas dele direto, ouço os conselhos.

Vocês acham que têm o estilo de jogo parecido?
F: Acho que sim.
P: Eu já acho que ele é bem mais técnico. Eu era mais um jogador de força, de velocidade, mas não tinha o recurso técnico que ele tem. O recurso técnico dele é muito superior.
F: Mas quem me ensinou foi ele. Ele foi o meu primeiro treinador.
P: O que eu dizia para ele era: seja zagueiro, mas seja um zagueiro muito melhor que eu.

O que você imagina para sua carreira?
F: Eu confesso que trabalho todo o dia pensando na minha futura esposa, no meu futuro filho, na minha família. Isso é uma coisa que tem de estar na cabeça da gente. Quando isso está na cabeça de um jogador novo, ele com certeza se destaca. Quando você escolhe um foco e trabalha para buscá-lo, fica mais fácil. Por isso, eu planejo jogar no exterior, acho que todo jogador brasileiro pensa nisso. Mas eu sonho também em jogar na Arena. Acho que esse não é um sonho só dos jogadores aqui do Atlético, mas de qualquer jogador do Brasil. Jogar na Arena não é para qualquer um, não. E como meu pai participou da inauguração da Arena, jogar lá é uma motivação bem maior para mim.

Quais são as coisas boas e as ruins da carreira de um atleta?
P: O bom é a amizade que fica. A gente faz muitos amigos, conhece muitos lugares. De ruim, acho que são as contusões. Eu tenho vários problemas: meu ombro sai do lugar, tenho luxação no braço, já operei meu rosto, estou com artrose agora (risos). Mas se perguntassem para mim se eu faria tudo de novo, eu diria que sim. É muito bom jogar futebol.

Como você se prepara para o futuro?
F: Eu que estou começando agora sei que tenho que tomar cuidado com algumas coisas que podem me tirar do caminho. O jogador que está começando tem de descansar bastante, tem de se alimentar direito. Às vezes, detalhes assim influenciam.

Agora, com a convocação do Marcão para a Seleção Brasileira Sub-17, pode-se dizer que valeu apena todo aquele sacríficio do começo?
P: Acho que sim. Eu dou graças a Deus por ele ter chegado à Seleção agora. Eu acompanhei o processo desde o início. Ele tinha dificuldade na velocidade, impulsão, tempo de bola. Então, hoje eu fico muito contente porque ele melhorou em tudo isso. Ele melhorou na velocidade, o cabeceio dele é muito bom.

Como foi a notícia da convocação do Marcão para a Seleção?
P: Desde o ano passado a gente já tinha esperança de ele ser convocado. A gente sabe que é muito difícil, mas sempre torce. Nós estávamos esperando a convocação na segunda. Passamos a segunda e a terça na expectativa. Cada vez que eu ligava, ele já achava que tinha saído alguma coisa. Mas daí na quarta-feira foi confirmado. Quando ele chegou em casa foi aquela gritaria, todo mundo comemorando e agradecendo a Deus.

Você já sabe o que você vai encontrar lá na Seleção?
F: Não tenho noção de nada, é um sonho. Mas futebol é futebol, não tem segredo. Se eu fui convocado é porque tenho qualidades. Então, vou procurar me esforçar bastante nos treinamentos e a conseqüência virá disso.

Marco Antônio de Almeida Ferreira (Marcão)
Nome
Marco Aurélio Lira Ferreira (Marcão)
Santo Antônio de Pádua (RJ), 20.12.1965
Nascimento
Campinas (SP), 23.06.1988
zagueiro
Posição
zagueiro
Atlético, Guarani, Santa Cruz, Mogi Mirim, Paraná, Inter, Inter-SP e Brasil-RS
Clubes
Internacional, Vasco e Atlético
1985 a 88 e 99. Foi campeão paranaense em 1985 e 88 e da Seletiva em 99.
No Atlético
2001 a 2004. Foi campeão paranaense juvenil em 2004.


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