28 mar 2001 - 23h15

Furacao.com entrevista o presidente Marcus Coelho

A Furacao.com foi direto à fonte e entrevistou de maneira exclusiva o presidente do Atlético Marcus Aurélio Coelho. Em um longo bate-papo, Coelho explicou todas as atitudes da diretoria, atendo-se principalmente ao preço do ingresso praticado na Baixada. Além disso, o presidente falou sobre o término da Baixada, a política de contratação e venda de atletas, o fim da lei do passe e o futuro do Atlético no cenário futebolístico brasileiro: “Eu sou torcedor. Comecei aqui dentro do Atlético, ali naquela mesma curva onde todos estão vendo o futebol hoje e pretendo voltar pra lá quando acabar o meu mandato. Mas o que acontece? Nos colocam numa posição de conflito, quando estamos tentando fazer exatamente o contrário” Confira a íntegra da entrevista:

A torcida vem reclamando do preço de ingresso (uma arquibancada está custando R$ 15). A Furacao.com realizou uma pesquisa perguntando se a torcida rubro-negra iria comparecer ao estádio na próxima quinta-feira, contra o Treze, pela Copa do Brasil. 63% afirmaram que não vão porque o ingresso está muito caro. O que o senhor tem a dizer sobre isso?
Não vejo razão para o torcedor atleticano estar chateado com seu clube. O Atlético Paranaense vem sendo apontado como um dos maiores clubes do mundo, um dos maiores do Brasil. Não podemos tapar o sol com a peneira, não podemos ser assim tão ruins, na medida em que somos uns dos poucos clubes do Brasil que estão no ranking da FIFA, na medida em que a USP nos coloca como o quarto clube do Brasil. Não sei qual é a razão desse desconforto, dessa animosidade. Dizia-se que era o preço do ingresso, pois bem, o valor está reduzido para o jogo desta quinta-feira, fruto de um esforço muito grande da diretoria e do nosso departamento de marketing que está conseguindo uma parceria para suprir esta diferença, de tal forma que a nossa torcida e o caixa do clube sejam atendidos. Fizemos dentro de uma forma que considero ser criativa e eficiente diante de se administrar o futebol. Se a torcida não vier na quinta-feira, com a palavra está a torcida, que diz que 63% não viriam porque o preço do ingresso está alto. Pois bem, não está mais alto e espero que estes 63% vistam a camisa do Atlético e que façam aquilo que estão habituados a fazer, ou seja, aquela festa fantástica e maravilhosa em prol do Atlético Paranaense.

Outra reclamação dos torcedores é que quando o clube precisou deles, havia ingresso popular, mulher e criança não pagavam e agora que o clube tem esta estrutura não precisa mais do torcedor.
Isso não é verdade. Essa é uma forma totalmente incorreta de analisar tudo. Veja, o que precisamos hoje é de arrecadação para manter esta estrutura que é cara e custosa. Temos profissionais que trabalham dioturnamente para a conservação do nosso estádio. Temos um Engenheiro contratado só para tratar da conservação da Arena. Estamos respeitando a nossa torcida, dando a eles todo o conforto possível, fazendo com que tenham um lugar para assistir aos espetáculos do seu clube com toda a segurança. Isso não é desprezar a torcida. Isso é tratar bem a torcida. É ter respeito. Estaríamos desprezando a nossa torcida se déssemos a eles instalações precárias, se déssemos a eles desconforto. Não posso aceitar esse tipo de observação, sinceramente não posso. Porque tudo isso está sendo feito em respeito ao nosso torcedor. Estamos procurando retribuir dando aquilo que há de melhor, aquilo que nenhum clube do Brasil tem. Todos estão correndo atrás de parcerias para construir uma Arena como esta e ainda não conseguiram fazer. E o Atlético sozinho conseguiu e fez isso para a sua torcida. Não fez por outra razão. Não fez para o uso e deleite seu e meu. É da torcida. Agora, existe um custo para isso. Se você viaja de primeira classe existe um custo. Se você viaja de classe econômica, tem outro custo. Um hotel duas estrelas custa menos do que outro cinco estrelas. Estamos oferecendo para a nossa torcida um hotel cinco estrelas. Isso não é desrespeito, isso é respeito. Queremos que o nosso torcedor seja tratado com dignidade, que tenha como se alimentar, sem correr o risco de ter problemas médicos. Que tenha um banheiro para utilizar, sem ter que recorrer aos muros do estádio. Não sei porque razão isso começou a fomentar-se, entre a nossa torcida, esse tipo de informação, que é falsa e totalmente contrária a tudo aquilo que pensamos. Queremos é o torcedor aqui e como? Bem acomodado, seguro, tendo o privilégio de assistir o jogo dentro de instalações únicas no Brasil. Isso é respeito ao torcedor.

No Campeonato Paranaense do ano passado foi feita uma promoção na qual crianças até 10 anos não pagavam ingressos. E este ano? Por que não foi mantida a promoção? Existe a possibilidade de ela voltar acontecer, já que diminuiria os gastos de um pai de família?
Nós já estamos fazendo uma redução para o jogo desta quinta-feira. Portanto espero que toda aquela veemência de críticas recebidas até então sejam somadas a uma veemência de elogios. É assim que as coisas devem ser. Pelo menos espera-se que sejam. A situação do ano passado foi diferente. Vou colocar pra você situações que estão passando desapercebidas pelo nosso torcedor. O futebol brasileiro está passando hoje por uma situação de mudança radical dos seus princípios, das suas fórmulas, regulamentos e Lei. Uma das situações que aconteceu este ano, que estava anunciada e ninguém acreditava nela, foi o fim da Lei do Passe. O passe era para o Atlético Paranaense, como para todos os grandes e pequenos clubes do Brasil, a grande fonte de receita. No caso do Atlético, que foi um dos clubes que mais vendeu jogadores nesses últimos tempos, representava na faixa de 90% das nossas arrecadações. Essa realidade muda dia 26 de março, quando será extinto o passe. O que vai acontecer? Essa receita não vai acabar de imediato, mas ela vai ser drasticamente reduzida. E, a partir do momento que você, como administrador, tem uma redução drástica de uma receita importante, você tem que otimizar as suas receitas tradicionais e procurar por novas receitas.

Quais seriam as novas receitas?
O Atlético tinha um planejamento que foi todo por água abaixo. Era a formação de jogadores, a venda de jogadores – até certo ponto – e pagar suas dívidas. Isso o clube fez. O passo seguinte era pegarmos uma parceria que viria interessada também em ser proprietária de passe de jogador. O que aconteceu? Caiu o passe, veio a CPI que deixou o futebol de perna pro alto em nível de legislação. Eu sou otimista e acredito que o futebol deverá ficar melhor depois disso tudo, com novos regulamentos para solucionar alguns problemas que existem. Mas até lá você não tem nenhum investidor disponível para fazer associações aqui no Brasil. Veja, nenhuma parceria foi fechada este ano. E as que aconteceram estão sendo discutidas. Por que? Porque foram fechadas fundamentadas na Lei do Passe. Com esta realidade você tem que tomar medidas consonantes com ela. Ou seja, quais são as nossas receitas? Patrocínio de camisa, venda de ingresso, patrocínio de placas e essas tem que ser elevadas. Porque estamos fazendo isso? Foi o Atlético Paranaense que criou isso? Não, não foi. Foi o mundo que criou isso. Se você acompanhar a evolução do futebol inglês – que passou por algo muito semelhante ao que está passando o futebol brasileiro – vai ver as soluções que eles encontraram e verá que estamos procurando o semelhante, com as duras penas, enfrentando todo o tipo de críticas e sendo jogados contra nossa torcida. Nós que somos torcedores. Eu sou torcedor. Comecei aqui dentro do Atlético, ali naquela mesma curva onde todos estão vendo o futebol hoje e pretendo voltar pra lá quando acabar o meu mandato. Mas o que acontece? Nos colocam numa posição de conflito, quando estamos tentando fazer exatamente o contrário. Estamos querendo dizer: ‘gente, aquela situação mudou!. A nova realidade do futebol é esta!’. Sinceramente, tenho receio de pegar e dizer que vou cobrar 5 reais. Eu não tenho mais o passe do Lucas para vender no mês de julho. O Lucas, que foi um negócio fantástico para o Atlético, não vai acontecer mais e tenho que procurar outras receitas. Não quero – e falo isso na primeira pessoa, porque esse é um assunto polêmico, e não quero envolver os meus pares – deixar um legado daqui a seis meses de um clube endividado e sem perspectivas. Acho que a nossa torcida tem que estar atenta com esse fato.

“O futebol brasileiro está passando por uma mudança
radical” [foto: FURACAO.COM]

Não seria uma questão de falta de transparência? Assuntos como este não tinham de ser levados ao conhecimento do torcedor com mais freqüência? Como era antes?
Tenho procurado dizer isso que te falei a todos que me perguntam, até numa situação de pregação. “Olha gente, é assim, assado, mudou, temos que estar preparados!”. Mas eu vou me confessar a você, não estou encontrando eco nessa situação. Não tenho visto o reflexo deste debate, as pessoas enfrentarem estes argumentos. O que vem é: “mas o clube precisa da torcida”. Mas é claro que precisa. Chegaram a escrever que eu disse que o Atlético não precisa da torcida. Isso é uma maldade. Apenas estava dizendo que na quinta-feira quem vai ganhar o jogo não vai ser a torcida, mas o time. Começamos mexendo no time, na questão da torcida, na questão do ingresso, porque não se pode ter apenas uma atitude numa situação como esta. É mais complexo, não é somente ‘o preço do ingresso’. Mas é isso também. Queremos a torcida aqui, todos junto torcendo, vibrando como sempre foi. O que eu disse foi: não vai ser essa torcida, por maior esforço que ela faça, que vai conseguir marcar os 3 ou 4 gols que precisamos fazer contra o Treze. Dentro de campo quem vai fazer são os jogadores e a torcida tem uma fator de importância, nesse aspecto, limitado. Ela vai até um certo ponto, prova disso: Internacional x Atlético, Baixada, ingresso a 5 reais. Internacional com 10 jogadores e perdemos de 2 a 1. Quer dizer, a torcida vibrou e acompanhou até o final, fez o que podia e não podia, só que tem limite. O que estou te dizendo, com toda a clareza é: apenas o ingresso não vai resolver o problema de quinta-feira. Temos que ver a questão de dentro do campo. De repente você não tem o resultado e a torcida é culpada porque veio ou porque não veio, não torceu. Vamos colocar os pingos nos “is”. Quando a gente administra, temos que ter este tipo de serenidade. Não podemos ser tão passionais na hora de tomar as medidas. Então, a questão do preço do ingresso não é uma vingança, ela não é uma imposição da diretoria. Ela tem suas razões, tem fundamentações. Vou te dar mais um motivo. Deve vir agora uma medida provisória que vai regulamentar algumas questões do futebol: a necessidade de que todos os estádios tenham cadeiras numeradas. A partir desse momento acontecerão outras coisas. Você vai reduzir o número de pessoas dentro do estádio, porque essas cadeiras ocupam mais espaço. E eu te pergunto: vamos poder continuar, com a redução de espaço – dando mais este conforto e tendo que fazer a manutenção dessas cadeiras – , cobrando o mesmo preço que em 1995? E isso vai acontecer agora, provavelmente para o segundo semestre ou para o início do ano que vem. E tem que chegar ao conhecimento da torcida. Vai ser algo do qual não teremos como fugir. Então, a grande dificuldade que a gente encontra é poder administrar o clube e atender aos desejos de todos os torcedores. Eu vi recentemente jogos sendo realizados a 5 reais e vejo jogadores, ídolos nacionais, vindo a público reclamar de salários. Vejo jogadores obtendo passes na justiça por falta de pagamento. Será que é isso o que a gente quer para o nosso Atlético? Estes custos precisam ser retribuídos para que tenhamos uma administração onde nosso atleta receba em dia, tenha suas contribuições cumpridas. As pessoas não estão querendo uma mudança no futebol hoje? Que o futebol seja administrado com competência, com rigor, com profissionalismo? É isso o que estamos procurando fazer.

Seria como sofrer agora para obter os benefícios amanhã?
Nenhuma modificação se faz sem esforço, sem custo. E nós, infelizmente aqui no Atlético, somos vítima do pioneirismo. Porque só nos cobramos 15 reais? Quem mais tem uma Arena no Brasil? Então ninguém mais pode cobrar 15 reais, mesmo. Temos o que oferecer ao nosso torcedor. Será que os outros tem a mesma qualidade? Você acha que o preço do nosso ingresso aqui tem que ser o mesmo dos demais?

E a venda do Lucas? Este dinheiro foi utilizado para qual finalidade?
Pagamos dívidas. Todas as vendas que fizemos ano passado, com muita maestria, foram para pagar nossos principais débitos. Hoje, o Atlético não tem caixa. Não tem reservas financeiras. Mas em compensação é o clube mais saneado do Brasil. Quase não deve. Tem seus impostos em situação regular. Estamos passando por todas estas investigações. E todo o mundo quer investigar o Atlético, porque foi o clube que fez. Tudo está sendo mostrado, muito claro. Então, não temos o dinheiro em caixa. Imaginávamos que teríamos, no começo do ano, a venda de um jogador para fazer um caixa necessário e contratar jogadores, mas esta venda não aconteceu. Frustou. Imaginávamos que teríamos nosso parceiro. Estava quase certo. Veio essa revolução no futebol, todos os parceiros encolheram. Então, nosso projeto inicial teve que ser recuado e estamos hoje trabalhando dentro da realidade do clube, que ainda é muito boa. Fizemos contratações, trouxemos jogadores e vamos continuar fazendo mais dentro do limite. A Argentina fechou seis contratos de parceria no vácuo do Brasil. Os investidores que estavam vindo foram pra lá. Temos que administrar dentro das possibilidades do clube, contendo as despesas de tal maneira que a gente não leve o Atlético para uma situação como de muitos outros que estão aí.

E a Baixada?
Terminar a Baixada… nós não temos dinheiro para isso agora e nem podemos porque o Colégio não sai. Eles têm uma ordem judicial e enquanto não ficar solúvel, não se resolver, não temos como construir. Não vamos invadir e começar a construir. Não podemos fazer nada.

Entrevista realizada por Alethea Costa



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