A trajetória de uma decisão
À PROCURA DO INGRESSO
Foi uma semana de trabalho e de uma saúde precária, já que estava gripado. Não tive tempo de pensar muito na decisão. Não tive tempo nem de providenciar o ingresso. Foi então que meu colega André, preocupado com a aquisição do mesmo, me deu a idéia de ligar para outro colega, Paulo Boscardim. Não deu outra, ele sempre solidário me conseguiu um ingresso. Foi a partir daí que comecei a me envolver e me concentrar no jogo. Procurei garantir minha passagem para São Caetano. Consegui passagem de ida aérea. Fui até a rodoviária e garanti a passagem rodoviária de volta. Encontrando um conhecido, meio encabulado relatei que iria assistir a final lá. “É muita vontade” me devolveu. Aliás o comentário foi geral: “Você é louco”, “não acredito que você vai até São Caetano”, ” você vai pra lá ?!”, com ar assustado. Mas a decisão já estava tomada. Até mesmo porque, não fui ao primeiro jogo aqui e decisão de campeonato tem de se assistir no campo e ao vivo. Principalmente valendo um título nacional.
Me encontrei com um atleticano autêntico, Guido, que me repassou o ingresso. No seu escritório havia a marca do Atlético do porta retrato ao porta canetas. Mas sua ansiedade era o que mais marcava o seu comportamento. “Temos que trazer este título”, tentava se convencer. Me contagiei, e daí era tarde, não só estava decidido a ir ver a decisão como o clima, angústia e motivação para a guerra em campo me invadiram totalmente. Guido, você me passou a importância deste título, porque assim como você, estavam milhares de atleticanos com a mesma expectativa.
Na manhã de domingo acordei com um sonho que tinha medo até de falar. O São Caetano tinha ganho de 5 a zero do Atlético. Um frio no estômago me bateu. Ora, era apenas um sonho. Este desastre não poderia se concretizar. A dúvida me assombrou! Afinal o time adversário era muito ofensivo e perigoso. “Não vou pensar nisso”. Vamos em frente.
O CAMINHO DE IDA
Estava no aeroporto às 9:15hs aproximadamente, graças à carona de minha esposa Gisele, que juntamente com meus filhos, Giuliano e Fabrizio (meus verdadeiros campeões!) foram me desejar boa sorte e boa viagem.
Chegando lá já vi um aglomerado de atleticanos tirando foto, tanto a certeza do sucesso por vir. Outros atleticanos caminhavam dispersos mas confiantes. Confiança, esta era a emoção que invadia a todos, com uma certa ponta de ansiedade.
Em São Paulo e depois na entrada de São Caetano do Sul com a população toda de azul, por vezes nos hostilizando civilizadamente. Aliás a torcida deles era muito pacífica. A confiança permanecia em alta.
NO ESTÁDIO
Aí sim a emoção começou a suplantar a razão. O clima de rivalidade reinava. O Estádio se mostrava ostentoso em nossa frente. Nós poderosos caminhávamos para a entrada com o porte de um manga larga e com a vantagem de dois gols como garantia de sermos superiores. A chuva castigava impiedosa como querendo jogar a favor do São Caetano e apagar o fogo da galera rubro-negra. Nada nos tirava a confiança e ao entrar no estádio a decepção. Iríamos ser campeões naquele estádio?! Todos comentavam como que um título poderia ser decidido em um local que para nós parecia mais o Durival de Brito ou a Estradinha de Rio Branco. Era a própria cara da desorganização, descaso e amoralidade da CBF. Mas apesar disso, a visão de ostentar uma estrela amarela no peito nos magnetizava.
A chuva não parava de cair. Minha preocupação era ela estragar o espetáculo do furacão. “Será que poderia estragar o nosso título?”. O jogo do São Caetano e Atlético Mineiro não me saía da cabeça.
A chegada de uma multidão de atleticanos fortificava quem estava no estádio. Como que o importante era surpreender o adversário em números. Mas realmente não parava de entrar torcedor do Atlético. A chuva não parava. O sangue estava quente. Os pingos batiam no corpo e evaporavam tal o fogo que nos incendiava.
“Como essas horas não passam?!” pensavam todos. Teríamos que esperar quase quatro horas. A situação do estádio era precária. Não havia nem cerveja, nem lanche para nos alimentar. Tivemos que pagar ágio para um vendedor nos trazer do outro lado do estádio um sanduíche com suco. Cerveja, nem (não Nem!) pensar.
O tempo melhora. Mas nada importa mais que o começo do jogo.
Aplausos são dados para Ricardo Pinto que entra junto com Flávio e André Luís para o aquecimento. Pensava: “Que responsabilidade desse goleiro em segurar as bolas adversárias. Mas sua experiência passava segurança”. Geninho entra em campo e é ovacionado. A galera vibra com as meninas da FPF que encantam o espetáculo.
Chapéus de Ribeirão Preto eram distribuídos com as cores vermelho e preta e uma bandeira estendida com o nome de Ribeirão Preto, era pura retaliação ao São Caetano que lhe tinha tirado do campeonato. Um torcedor corintiano se misturava a nós com a camisa da seleção. Era o reforço que vinha em boa hora.
Os jogadores entram em campo para aquecimento. Alegria geral. Confiança redobrada. Profissionalismo atuante no reconhecimento do gramado. Não pode dar outra o Atlético tem que ser o campeão!
Os jogadores se concentram em roda e são liderados por um dirigente para despertar o espírito de união e motivação. Pensei: “o Atlético ganhou o título nessa conversa!”.
O JOGO
Os heróis entram em campo. Se dirigem até a galera e parecem estar muito concentrados.
Começa o jogo! “Vamos lá Furacão. Personalidade e calma, que só restam 90 minutos para o título!”. Não precisava nem dar a receita, eles estavam muito conscientes.
Lances daqui e dali! Quantos minutos? Só 4 minutos?! Meu Deus, como esse tempo não passa! Vai ser sofrido.
O jogo corre. Nem recebe o amarelo. É, Nem já começou a aprontar! Vamos gente, calma.
E vai assim o tempo todo. Lances não tão perigosos contra o nosso lado eram sofridos na alma. Não, essa bola não pode entrar. Primeiro tempo acaba. Só restavam 45 minutos.
Aos poucos os lances se desenrolam. Adriano o craque, Kléberson sempre tranqüilo e talentoso, Alessandro veloz e audacioso, Fabiano o apoiador (um dos melhores em campo), Flávio seguro, Igor com personalidade, Souza com experiência, Alex correndo muito e buscando jogo, Kleber ajudando a defesa e pulando como ninguém nas bolas, Gustavo, que monstro contra Magrão, Nem o poderoso, Rogério o guerreiro, jogam muita bola e já sabiam que iriam ser campeões (só esqueceram de contar para nós). O adversário não oferecia tanto perigo como no primeiro jogo.
Aos poucos senti que poderíamos até ganhar o jogo. O time tinha personalidade, confiança, equilíbrio. Ou seja, estava com pinta de campeão.
Aos 22 minutos veio a glória: GOOOOOOOL! É o gol do título! É o gol do título! A festa tomou conta da torcida. Meu Deus, o sonho estava prestes a se realizar! Não, ainda não acreditava. Não poderia ser, nós campeões do Brasil. Para trás São Paulo,Palmeiras, Corinthians, Flamengo… Sim, era pura realidade. Aos 4 0 minutos a torcida apreensiva e não acreditando antes, soltou o grito: É CAMPEÃAAAAAAO! É CAMPEÃAAAAAAAAO!
A torcida adversária abandonava o estádio. A galera rubro-negra gritava: BI-VICE, BI-VICE!.” FICA C…..ÃO, PRA VER O CAMPEÃO”, “COXARADA FDP….” “TÁ CHEGANDO A HORA, ….””ATLÉTICO, ATLÉTICO, CONHECEMOS SEU VALOR…”
Vibração total. Que emoção! Não acreditava ainda. Apito final. Sim é verdade! Somos campeões nacionais, somos o melhor time do Brasil! O céu é o limite! Agarramos e tatuamos no peito e no coração a tão sonhada estrela!
Liguei para meu irmão. Falava em tom confuso com todos do outro lado. Só podia dizer: ” Temos a estrela amarela no peito, somos Campeões. Meu irmão me lembrou que teríamos que colocar a faixa no túmulo do nosso pai, origem de toda esta paixão. Chorei! Embarguei a voz e prometi que iríamos lá sim.
Ao término da partida só tinha dois pensamentos: OBRIGADO PAIZÃO! OBRIGADO FURACÃO!