O Furacão é outro
Tenho acompanhado de São Paulo esse estranho momento do Atlético e achado que o que há de melhor e mais positivo na nossa fase está sendo esquecido. Esse site que já há alguns anos é o principal fórum da nação atleticana é um exemplo de um equívoco geral. A matéria do início do campeonato feita pelo site comparava o início desse com aquele inesquecível Brasileiro de 2001. Dizia o autor que aquele time de 2001 “estava embalado” e repleto de “estrelas reconhecidas nacionalmente” ao contrário do atual. Será? É engraçado como nós nos enganamos e modificamos o passado conforme a percepção do presente. Lembro e tenho cópias de artigos publicados pelos colunistas do furacão.com na época – em absoluta sintonia com a maioria da torcida e da imprensa, dizendo que as chances do time eram novamente mínimas. Falava-se que a falta de ousadia em contratar seria o principal responsável da possível e quase inevitável má campanha do time. Um dos colunistas, cujo primeiro nome acho que era Christian, anunciava que estava de saco cheio de ver timinhos vestirem a camisa do Atlético e ironiza aquela parte da imprensa que falava bem dos jogadores “medíocres” que eram a tônica do time, especialment o “ridículo” Kléber, e “esses jogadores que vêm das divisões de base” – falava talvez de Kléberson. E decretou que a contratação de Souza era mais uma bobagem. E que o time caminhava para o vexame.
Ou seja, não havia nem no furacao.com, nem em nenhum orgão de imprensa a mais remota percepção que viria ali um título. Pelo contrário, havia uma sensação de frustração devido a várias desclassificações em torneios importantes e a sensação que com “aquele time” não havia chances.
Mudar a história agora é prejudicial para o nosso presente.
Algo parecido é dito que naquela época tínhamos jogadores consagrados nacionalmente. Quem? Kleber? Kléberson? Fabiano? Queeeem? Perguntaria a nação inteira que via o Atlético como um coadjuvante total onde só jogavam coadjuvantes. Alessandro era considerado um equívoco na lista de convocações da seleção e jamais foi levado a sério pela imprensa nacional.
Eu que já morava em São Paulo senti isso como ninguém.
E vamos aos fatos positivos. Primeiro, agora sim temos jogadores consagrados nacionalmente e inclusive internacionalmente. Fato absolutamente inédito em inícios de campeonato, ou melhor, em termos 2002 também foi assim, digo em termos porque o grande comentário sobre o time em todos os guias e cadernos especiais sobre o início do campeonato do ano passado especulavam sobre para onde iria o time desmontado, havia um descrédito ainda forte em relação ao time.
O time tornou-se grande na percepção nacional. Não só pela Arena, o que não foi suficiente. Não só pelo título e pela estrutura que também não foram. Mas pela somatória desses fatores e do extraordinário fato de o time não ter sido desmontado. Pelo fato de manter até hoje Kléberson na Baixada. Não importa a fraca campanha de 2002 (em que “apenas” tivemos o segundo melhor ano da história do time em que fomos vice na Sul Minas e Tri-Campeões paranaenses), para a percepção da opinião pública e imprensa nacional não importa sequer que Kléberson esteja jogando mal e que o time esteja ainda pior nesse início de ano de 2003. O furacão ganhou 2001 e ninguém conseguiu desmontar o time. Ninguém. A sensação nas conversas com os paulistas daqui foi a primeira pista, a forma como o Furacão é tratado na imprensa foi outra.
Há dois dias, a Folha publicou seu caderno especial sobre o atual Campeonato. Apesar do tom de crítica ao time tudo é diferente. Tudo. A crise do time é comparada à crise de Internacional e Palmeiras, percebam a diferença. Outra coisa, há 24 times no campeonato. A folha dar destaque para 12, que ganharam espaço de 3/4 de página, e colocou os outros doze no pequeno quarto restante. Quais os times escolhidos? Dez saíram da velha lista dos doze “grandes”, faltavam dois lugares, Bahia que além de campeão de um campeonato brasileiro respeitável (Ao contrário por exemplo dos rídiculos campeonatos de 85 e 86 que devido a má fase do futebol brasileiro teve times medíocres nas semifinais e finais, em 85 o terceiro foi o Brasil de Pelotas, o vice foi o Bangu!) – voltando além de Bahia qual seria o escolhido? Ou melhor, provavelmente antes do Bahia, os editores da Folha escolheram o Furacão. Escolheriam quem? Talvez Guarani, que além de também ganhar um campeonato respeitável, tem história de revelar grandes jogadores. Mas não houve dúvida. Outro exemplo, os sites gaúchos apesar da má fase do time consideram o Atlético “um osso duro de roer”, porque, segundo um jornal de Porto Alegre, “o furacão na baixada é sempre difícil”. Isso é tradição. É como percebeu e escreveu Mafuz hoje na Tribuna, o jogo tornou-se um clássico, de verdade. Há uma clara percepção no sul do país que o grande jogo da região é esse. E por razões bem mais profundas do que a velha argumentação de que esse é melhor que aquele.
O time que entra hoje em campo tem estrelas nacionais, terá uma internacional e um técnico respeitado no país inteiro. Pode-se reclamar do time. Mas a fase é outra. E é definitiva. O furacão precisa ir muito mas muito mal para perder isso. Vide o caso do Internacional que até hoje é considerado um time “grande” e nem os mais de quinze campeonatos medonhos praticamente seguidos impedem o time de sair da lista de elite da imprensa e percepção pública brasileira. O furacão não tem direito aos mesmos quinze anos para manter essa imagem. Mas tem uns sete, oito, e não vai precisar porque ao contrário do que o autor do texto de ontem do site, nós estamos entrando no campeonato com um time cheio de jogadores respeitados nacionalmente e um técnico também visto assim. E a principal razão não é só a nossa brilhante e única história recente, a principal razão hoje é que eles usam a camisa rubro-negra. É como disse o texto da Folha de São Paulo no dia seguinte à conquista do título de 2001: “para ser grande esse time organizado e planejado precisava de apenas mais uma coisa, o título, agora não precisa mais”.
Isso tudo independe do que vier acontecer no campo nesse campeanato que começa hoje. Mas falando agora sobre o que vai acontecer no gramado, há uma grande chance desse time cheio de grandes jogadores em má fase, posso se acertar ao jogar diante de times que têm uma camisa equivalente à sua. Pois no último campeonato que disputamos, apesar da presença dos esforçados coxas – vistos como um time apenas um pouco abaixo do Guarani, não havia nenhuma camisa que pudesse sequer pensar em comparar-se à nossa, e o desânimo era evidente. Como agora há camisas à altura, o ânimo deve voltar e quem sabe o time desencante.
Em tempo, estou ouvindo a Rádio Gaúcha – escrevi esse texto ao longo do jogo – agora estamos aos 35 min do segundo tempo. Ilan tenta um chute e erra, a torcida vaia, o locutor gaúcho diz “O Atlético ganha de 2×0 e a torcida vaia, que torcida chata”. No fundo o momento que passamos é esse: um time grande com uma torcida chata. Torcida que chega ao ridículo de dizer e escrever (o que li em um outro site) que Petraglia é um perdedor. É hora de voltarmos a ser uma torcida sensata e apaixonada, sensata porque não se é campeão brasileiro todo ano, o Cruzeiro nunca foi; e apaixonada porque é, porque sempre foi. Aí sim seremos o que é nosso destino ser: time grande com torcida que o empurra sempre.
O jogo está terminando, o repórter gaúcho fala “o Grêmio perder para o Atlético na Baixada não é resultado inesperado, é normal, chato é o olé que o time está levando agora com a torcida gremista saindo antes do jogo acabar”. Um pouco adiante o melhor jogador é eleito por unanimidade pelos gaúchos: Adriano. “Um jogador que já nos acostumamos a ver jogar brilhantemente já faz alguns anos”. Ou seja um jogador é tratado como estrela e o time como um adversário de grande respeito. É isso que eu quis demonstrar. Nada mais forte do que as vozes do sempre arrogantes gaúchos para confirmar.