24 ago 2004 - 23h12

Pensando no futuro

No último sábado, o programa Mundo Corporativo, da Rádio CBN, tratou do tema gestão e planejamento de clubes de futebol. O jornalista Heródoto Barbeiro conduziu uma entrevista com o admistrador de empresas Amir Somoggi, especialista em mídia e marketing esportivo. Logo na primeira resposta de Somoggi, surgiu o exemplo do Clube Atlético Paranaense como o mais bem planejado clube do país.

Somoggi tem pós-graduação na FGV e na Universidade de Barcelona. Consultor e professor de gestão de entidades esportivas e estratégias de marketing esportivo, ele já atuou como analista de marketing do Unibanco. Atualmente, presta consultoria a Faculdades, clubes, ligas, federações e empresas ligadas ao esporte.

Durante a entrevista, o professor tratou de diversos temas interessantes e atuais. Discorreu sobre a importância de fortalecer a marca do clube e de gerar a fidelização dos torcedores, mediante a concessão de benefícios. Além disso, reforçou a importância da venda de carnês, algo que vem sendo praticado pelo Atlético há várias temporadas. Por outro lado, afirmou que é importante ampliar o poder de decisão dos clubes, conferindo poder de voto a todos os proprietários de carnês e não só ao Conselho Deliberativo, algo que ainda não é aplicado pelo Atlético.

De qualquer modo, reafirmou que o Atlético é um dos poucos clubes brasileiros que têm um projeto a longo prazo e que fazem um planejamento estratégico de suas ações.

Leia abaixo alguns trechos da entrevista de Amir Somoggi a Heródoto Barbeiro. Clique aqui para ouvir a entrevista em áudio, direto do site da Rádio CBN.

Existe gestão esportiva planejada no Brasil?
Há alguns bons exemplos no Brasil. Eu gostaria apenas de citar apenas um como principal exemplo, que é o Atlético Paranaense. A gestão amadora dos clubes acaba sendo encoberta por boas ações de marketing. Mas a verdadeira gestão profissional é a estratégica, aquela de longo prazo. O Atlético Paranaense já foi muito criticado quando diziam que ele estava apenas preocupado em se tornar uma grande marca. Na verdade, o presidente do Atlético Paranaense, com uma visão estratégica, em dado momento implementou uma gestão a longo prazo. Eu estou defendendo o Atlético Paranaense como um consultor de marketing e de gestão de clubes. Não tenho vínculo nenhum com o clube para defendê-lo, apenas estou citando um excelente modelo a ser seguido pelos outros clubes. Então, a gestão amadora está na falta de visão de longo prazo de quem dirige os clubes hoje no Brasil.

Em uma empresa, os gestores são cobrados. Agora, quem é que cobra de um gestor de uma entidade esportiva? Ou ele não é cobrado?
Nesse momento, discute-se muito no Brasil o Estatuto do Torcedor, mas ainda não se chegou a um consenso de como o Ministério Público deve atuar, de como a CVM deve atuar na fiscalização dos balanços etc. Só existe uma saída: a gestão que cada clube vai fazer. Há um trabalho a ser feito internamente para cada clube. Hoje os bons modelos de gestão do mundo são poucos. Eu posso citar a Juventus de Turim e o Manchester United, que têm uma estrutura muito desenvolvidada e que não veremos tão cedo por aqui. Aliás, esse não é nem o modelo que deve ser praticado hoje, na minha opinião. O modelo ideal, para mim, é o do Barcelona e o do Real Madrid. Os dois são clubes de um país ainda em desenvolvimento e adotam estrutura jurídica de entidades civis de caráter esportivo sem âmbito de lucro. É exatamente o que são os nossos grandes clubes. É essa a realidade que nós brasileiros temos de aprender. O futebol brasileiro tem de se transformar em um mercado consumidor e não apenas exportador.

Professor, o senhor diz que no Brasil o melhor modelo é o que não visa o lucro. Mas daí não tem aquela maracutaia de os dirigentes receberem polpudos salários e pagamentos indiretos?
Na Europa, você tem os annual reports dos clubes que deixam bem claro qual o salário de cada diretor, como o executivo de qualquer empresa. Essa transparência existe hoje e todo mundo se preocupa com isso. Aqui no Brasil, muitas vezes o Estatuto interno dos clubes proíbe que os diretores dos clubes sejam remunerados. Isso prejudica a transparência. Como implementar a gestão de longo prazo? O único caminho é contratar profissionais especializados nas diversas áreas, como gestão esportiva na área de marketing, legislação esportiva e finanças esportivas. Como nas grandes empresas, são os gerentes que devem tocar o negócio. O diretor ficaria responsável por outras áreas, como relacionamento com outros clubes e entidades. O que temos de ressaltar é que o marketing não pode ser o fim de um clube. Tem de ser o meio para atingir seu objetivo. O foco final de um clube, o que o seu torcedor deseja, é o desempenho esportivo. Mas há que se pensar o negócio de forma mais abrangente, tendo pessoal especializado dentro dos clubes.


Venda de carnês é receita essencial para o clube

Qual é a importância do marketing para o clube?
O time tem de explorar a paixão do torcedor pelo clube. E o torcedor quer ver os grandes craques atuando pelo seu time. Então a questão é: o torcedor, que é o consumidor, hoje está fora do negócio que é o futebol e vou explicar o porquê. Os torcedores são representados no clube pelo Conselho Deliberativo. São 300 ou 400 sócios mais influentes e antigos que determinam o futuro dos clubes. Lá na Europa, principalmente nos times que são clubes ainda, você tem a venda do carnê antecipado para o torcedor. Esse torcedor que compra o pacote de ingressos se torna um membro ativo do clube e representante do torcedor. O Barcelona, por exemplo, tem 100 mil carnês vendidos. Então, esses 100 mil torcedores representam todos os outros mais fanáticos. Esse é um ponto fundamental. Eu converso com diretores de clubes e eles me dizem que isso é um "vespeiro", que não dá para mexer nessa questão. Mas isso é essencial para a representatividade daqueles torcedores. Essa representatividade está ligada a você voltar a lotar o seu estádio. O estádio lotado leva você a, primeiro, ter uma receita muito grande para o clube porque vende os carnês antecipados. O Figueirense, por exemplo, implementou uma gestão profissional e, segundo informações, 50% de seu estádio está tomado pelos carnês antecipados.

E quanto à parte de exposição do clube na mídia, qual é a receita que esse marketing da marca gera para o clube?
Quando você conversa com qualquer diretor de clube menos estruturado, ele fala: "a Lei Pelé acabou com meu principal ativo". Na cabeça dele, o jogador é o principal ativo do clube, mesmo já não existindo o passe. A questão é: a marca é o principal ativo do clube. Porém, você precisa fazer com que a marca gere negócios para o clube. Clubes como Manchester United conseguem apenas com o comercial, que seria a venda de produtos licenciados, serviços credenciados (como plano de saúde), a sua maior fonte de renda de todos os valores gerados. Quando o clube vincula sua marca a um serviço, está automaticamente entregando milhões de torcedores fiéis. Ao invés de a empresa entrar no mercado para buscar clientes dos concorrentes, ele entra automaticamente com milhões de pessoas que apenas por torcerem para determinado time amam aquela marca e usam aquela marca. A segunda questão é que você tem de estudar muito claramente como a marca pode gerar negócios. A venda de jogadores também tem de ser trabalhada. Isso vai ser trabalhado na cláusula penal dos contratos com os jogadores. Essa saída de jogadores que a gente vê é uma falta de planejamento jurídico e de uma visão clara de como trabalhar os contratos. Finalmente, em relação à marca, o dirigente tem de aprender que os patrocinadores terão de comprar, através do clube, esses milhões de torcedores. Então, a essência do trabalho é você ter o foco no relacionamento contínuo clube-torcedor. Eu dou um exemplo: tenho amigos que compram pôsters dos clubes a R$ 20, R$ 30. Você imagine quantas pessoas não comprariam esses produtos se soubessem aonde comprar, onde encontrar. Então você tem de ter um desenvolvimento interno do deparamento de marketing para gerenciar todas essas questões.

Colaboração: Luiz Carlos Itonaga



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