15 nov 2004 - 13h35

Opinião de Ricardo Campelo

Irresponsabilidade
por Ricardo Campelo

A irresponsabilidade de um país culminou em uma situação absurda ontem na Baixada. Acabo de ver na TV a imagem dos torcedores que, acusados de arremessar objetos no gramado, foram vítimas de um semi-linchamento ainda na arquibancada – o espancamento só não foi completo por falta de tempo.

Tudo começou com a irresponsabilidade de um segmento da mídia, já bastante comentado aqui no site. Foram eles que começaram tratando como brincadeira um assunto sério. Bancaram os inquisitores apontando fatos e pedindo punição. A provocação não deveria, mas surtiu efeito e entrou em cena o STJD, que seguiu tratando o assunto como brincadeira. Sem um pingo de ética e parcialidade, começou a distribuir punições a esmo – "dois jogos pra você aqui; um jogo pra você ali; já você está absolvido". Assim como nós, colaboradores do site, damos notas para os jogadores após a partida – "8,0 pra você; 7,5 pra você… você eu não gostei, leva 6,0". Só que um eventual erro nosso, decorrente de nossas naturais limitações, não trará prejuízos a ninguém. Ao contrário dos malfadados atos deste STJD, que criaram prejuízos para alguns clubes e ontem culminaram em uma triste cena na arquibancada.

Um copo de plástico. Este material extremamente perigoso (e me admira a coragem do árbitro do jogo de tê-lo pego em suas mãos, ignorando o risco que este ato poderia causar à sua integridade física) gerou toda a confusão. Isto porque, nas regras da brincadeira do STJD, um copo de plástico no gramado pode mudar o mando de uma partida (e, consequentemente, o rumo de um campeonato que está na reta final). De repente um torcedor, sem nada na cabeça, jogou o perigoso copo plástico no gramado (temos sorte disto não ter resultado em mais uma morte no campeonato brasileiro). Foi o estopim que acendeu a ira, perfeitamente compreensível, dos outros milhares de torcedores que se indignaram com o risco que isto poderia gerar para o Clube.

Imediatamente, criou-se uma jurisdição da arquibancada. Alguns torcedores se investiram do poder investigatório e apontaram supostos culpados pelo atentado. Outros torcedores assumiram o papel de julgadores, decretaram a culpa daqueles, e imediadamente iniciaram o processo de coerção, com o espancamento físico e moral dos suspeitos. Uma cena lastimável. É nisso que deu o circo armado pela imprensa e pelo STJD. Que, repito, trataram como brincadeira um assunto sério. Influenciar o comportamento de milhares de pessoas reunidas com ânimos exaltados é muito sério, como ficou provado ontem.

Aconteceu com o Atlético, na Baixada, mas poderia acontecer em qualquer lugar. E certamente aconteceria. O Atlético, acuado com as brincadeiras do STJD e do circo jornalístico, pediu à sua torcida que o ajudasse a coibir o arremesso de objetos no gramado. Deu no que deu: agressões prematuras e inaceitáveis aos acusados.

Que este episódio sirva como exemplo para os irresponsáveis da mídia e dos tribunais desportivos tratarem o assunto com mais seriedade. E que os clubes tomem medidas para não permitir que a jurisdição da arquibancada se antecipe e se sobreponha à jurisdição oficial. Não é demais dizer: por mais estúpido que seja o ato de atirar um objeto no gramado, o procedimento de coerção deve seguir o seguinte rito: 1) identificação do infrator pelos seguranças ou policiais 2) retirada destes do estádio 3) abertura do procedimento penal com exercício de defesa pelos acusados 4) só então, caso verificada a culpa, que se apliquem as punições legais.

Ricardo Campelo é colunista da Furacao.com. Clique aqui para ler outros textos de sua autoria.

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