18 maio 2005 - 10h40

Holzmann explica plano de marketing do Atlético

Na noite desta terça-feira, o diretor de marketing Mauro Holzmann e o diretor de comunicação Toni Casagrande fizeram parte do Workshop Marketing Esportivo & Tendências de Sucesso realizado na FAE, no centro de Curitiba. Os dois conversaram sobre os aspectos relevantes de planejamento de comunicação, o futuro do futebol brasileiro e o case do Atlético no contexto nacional e internacional.

O professor Abel Correia, da Faculdade de Motricidade Humana da Universidade de Lisboa, iniciou a oficina com o tema "Marketing esportivo na Europa", discorrendo sobre conceitos de marketing e administração, além da importância e das características do futebol. "Esse esporte está presente em todos os lugares. É campeão na publicidade, nas audiências televisivas e na mobilização dos interesses públicos e privados", afirmou o professor, destacando o esporte como uma das áreas mais importantes do desenvolvimento humano.

Em seguida, Mauro Holzmann falou sobre a disputa do Atlético pelo espaço no mercado nacional e internacional, o processo de reestruturação do clube, da realidade e das expectativas para o futuro do futebol brasileiro. Depois foi a vez do diretor de comunicação do Atlético, Toni Casagrande, falar sobre o planejamento a relação entre a imprensa e a administração do futebol, comentando sobre a diferença entre crônica e jornalismo, e também a respeito da estrutura de um bom planejamento de comunicação. Confira os principais trechos da palestra de Mauro Holzmann:

O começo
"Em 1995, quando o grupo liderado pelo Mário Celso Petraglia se deparou com uma situação extremamente difícil, tanto em nível macro quanto local. Infelizmente, a realidade no futebol brasileiro não mudou muito. O futebol estava extremamente desacreditado na gestão de futebol: idéias antigas, clubes falidos, muita dificuldade na manutenção dos grandes clubes brasileiros, falta de organização nas competições e aspecto cultural muito complicado, como no caso do Atlético. Ou seja, a cultura de que o torcedor brasileiro tem em receber o futebol gratuitamente. O futebol brasileiro sempre foi dado de presente ao torcedor. Era muito barato, os estádios muito ruins, os custos de manutenção eram muito baixos e o torcedor recebia aquilo como uma dádiva. E no final aquele torcedor pagava pela conta, que era barata, e o consumidor do esporte não tinha aquela cultura dos outros consumidores, de pagar pelo que recebe. O clube não tinha patrimônio humano, nem físico. Não tinha um estádio em condições de se mandar grandes jogos, tínhamos o Joaquim Américo antigo, com instalações acanhadas. Não tínhamos lugar para treinar, sequer jogadores do clube. O Atlético tinha apenas dois jogadores de sua propriedade".

O plano
"A primeira coisa que se fez foi um plano estratégico. Imaginem o que é um plano estratégico de 10 anos para um clube de futebol É uma coisa de outro mundo. E todo mundo achava que esse tempo não passaria, não chegaria. E esse plano tinha um diferencial em função dessas dificuldades locais. Era preciso ser diferente. O Atlético, em nível nacional, não tinha nada para mostrar ao mundo do futebol, e muito menos ao mundo do patrocinador. Ele não era uma marca forte que poderia vender um sonho. Não tínhamos essa condição, era preciso fazer algo diferente. Então se decidiu que o diferente seria na área patrimonial. Fazer o que os grandes não tinham feito: estádio e centro de treinamentos moderno, para poder atrair patrocinadores e investidores".

Problemas
"Um problema bastante complicado é estarmos fora do eixo Rio-SP, pois, infelizmente, a maior parte da verba de publicidade e patrocínio fica principalmente em São Paulo, que representa 70% dos investimentos. Todo o dinheiro fica nas mãos dos paulistas. Ou seja, tinha mais essa dificuldade de atrair investidores para um Estado sem tradição no cenário esportivo, os clubes grande e tradicionais para o nosso consumo, mas sem nenhuma exposição. Isso foi um fato complicador para iniciar esse projeto."

A solução
"Foi então que o Atlético começou a fazer receita em cima da comercialização dos seus atletas. Buscamos algumas parcerias naquele momento, porque nós não tínhamos jogadores nossos, e fomos buscar jogadores fora, com parceria com alguns empresários para poder gerar a primeira onda de receita para iniciar o projeto da construção do estádio. Assim, em 95 tivemos condições de montar um time razoável, acabamos ganhando o título brasileiro da série B e revelando alguns jogadores, que foram comercializados ao fim da temporada, dando início ao processo da construção da Arena".

As estratégias
"Essa estratégia foi focada inteiramente no crescimento patrimonial do clube. Nós queríamos mostrar que era possível se fazer no Brasil algo diferente do que estava sendo feito, que era possível trazer de fora as experiências de construção de estádios. Através de todo o seu corpo de marketing e construção, o Atlético foi à Europa buscar tecnologias e modelos para adaptar à realidade brasileira e ganhar conhecimento para construir nosso estádio. Primeiro começamos a mexer com a alma do clube, através da mudança no escudo do Atlético que, como vocês sabem, era uma "imitação" do escudo do Flamengo. Só havia o CAP, que a nível nacional ninguém sabia o que era. Foi então que o pessoal da área de comunicação redesenhou o escudo, colocaram-o redondo, escreveram o nome do clube inteiro e a data de fundação, para mostrar que o clube tinha tradição. Nesse ponto, observamos um grande problema em nível nacional: o perfil do torcedor freqüentador de estádio. Resume-se em: 80% homens com baixo poder aquisitivo, média de 25 anos, consumo inferior a US$ 5.00 e a presença dos "hooligans" afugentando outros torcedores. Além disso, os estádios eram classificados como velhos, inseguros, sujos, desconfortáveis, sem infra-estrutura para atender o torcedor e com preço médio de ingresso a US$ 2.00. Ou seja, hoje temos um estádio padrão FIFA, com segurança, confortável, preço médio de US$ 7 dólares, 50% homens e 50% de mulheres. Essa é uma marca muito forte do Atlético, a mídia toda se impressiona muito com o número de mulheres, crianças e famílias. Outros dados: 89% consomem na praça de alimentação, gastando entre 5 e 15 reais, pouco, mas bom para o padrão brasileiro; 55% vão de automóvel e 47% possuem renda superior a R$ 1 mil. Foi aí que fomos buscar a volta da família ao estádio, que o futebol passasse a ser novamente um programa de fim de semana e não apenas a um jogo de futebol. Buscamos também a média de público de 15 mil pessoas, sem espaço para os "hooligans". Isso é uma coisa que na época a gente não tinha o Estatuto do Torcedor, as leis são complicadas. Agora, com os últimos atos de violência em São Paulo, está sendo feita uma maior identificação dos infratores etc. Nós aqui estamos punindo, promovendo campanhas de conscientização, incentivando a formação de fã-clubes e a organização do calendário para poder vender os pacotes, proporcionando preços e lugares melhores, ao mesmo tempo em que planejamos nossa receita financeira em cima desse tipo de venda".

Marketing atual
"Em cima desse conceito que o Atlético implantou em seus negócios e em sua vida, nós conseguimos fazer uma estratégia comercial que poucos clubes no Brasil hoje têm condições. Nós criamos uma série de propriedades de merchandising e fomos ao mercado com tudo o que o clube construiu, mostrando que mesmo fora do eixo Rio-SP as empresas podiam investir. Vocês sabem que hoje as empresas não querem mais fazer a publicidade tradicional. Elas querem o relacionamento com seu cliente, precisam estar em contato com o cliente. Dificilmente encontra-se nas grandes empresas o simples desejo de fazer propaganda só pela propaganda. Nós conseguimos levar um conceito diferente na Arena, para que ela pudesse ser utilizada como um grande instrumento de relacionamento com o seu cliente. Infelizmente continuávamos sozinhos no mercado brasileiro e imaginávamos que outros clubes teriam feitos seus estádios (Cruzeiro, Flamengo, Corinthians, Palmeiras), formando uma rede de estádios no mesmo padrão, fazendo com que essas empresas fossem procuradas por vários clubes, oferecendo um tipo de equipamento parecido. Infelizmente o Atlético continua isolado. Para vender um produto para uma grande empresa, eles continuam focados no mercado paulista. Primeiro porque não tem em São Paulo, segundo porque só tem esse parceiro no mercado brasileiro".

Kyocera Arena
"Conseguimos um grande parceiro, mostramos o diferencial do Atlético, que mesmo estando fora do eixo, eles poderiam através do estádio, do futebol, ficar mais próximo do cliente que eles querem alcançar. A Kyocera, um dos maiores grupos econômicos da Ásia, viu essa oportunidade e comprou o primeiro naming rights do futebol brasileiro. Conseguimos depois de 10 anos trazer um parceiro do tamanho da Kyocera. A partir daí sentimos que as coisas começam a ser facilitadas. Hoje 70% dos camarotes estão comercializados para empresas, que trazem outros clientes para transformar o dia de jogo numa grande oportunidade de entretenimento ou de negócios. Empresas como a Kraft, Nestlé, Phillip Morris, Umbro, Kyocera e empresas menores têm uma presença no estádio, usando o estádio para esse tipo de relacionamento. Nossos antigos patrocinadores, como a Claro e a TIM, mantiveram seus camarotes, proporcionando a convivência diária com o seu cliente. É normal encontrar torcedores de todos os times nos corredores dos camarotes. Estamos tentando fazer com que esse modelo seja entendido pela população. É uma grande dificuldade em se fazer isso no Brasil. Primeiro por não ser do eixo Rio-SP, a imprensa paulista sempre olha com certa resistência, nós temos dificuldade em fazer com que a mídia entenda o nosso projeto. Assim o público também não entende as mudanças que ocorreram no futebol mundial".

Atlético
"Se vocês observarem o balanço publicado pelo Atlético no último dia 30 de abril, notarão que o Atlético é um clube médio em nível comercial, com um orçamento de um clube média de 25 milhões de reais de orçamento. Isso é de uma empresa média. Há uma grande dificuldade de se buscar receitas para fazer frente às despesas. A bilheteria no Brasil ainda é muito baixa, o torcedor não tem a cultura de comprar os produtos e o merchandising é quase zero no Brasil. Por isso os clubes brasileiros os continuam tendo de vender seus grandes jogadores. A fonte de receita alternativa, a televisão, o merchandising ainda não conseguem fazer gente com as despesas do clube. Não existe almoço de graça. Se você quer um produto, você precisa pagar por isso. Caso contrário, a empresa irá quebrar. É uma realidade dura, num país com uma realidade injusta. Mas não cabe ao clube resolver isso. É um problema social. E para manter a estrutura do Atlético é preciso buscar consumidores dispostos a pagar por isso. Assim o público fica ainda mais exigente, porque o futebol, além de tudo, tem o jogo. Você tem que ganhar o jogo e a única coisa que não se planeja é o resultado dele. Tudo é feito em cima de algo extremamente difícil de planejar que é o resultado".

Outros clubes
"Nos últimos 30 anos, o Atlético foi o único a investir muito em patrimônio e mesmo assim ganhou muitos títulos. O São Paulo, por exemplo, ficou 15 anos sem ganhar um título enquanto construía o Morumbi. Nós conseguimos nos estruturar, fizemos nossa marca vencedora, atraímos a atenção da comunidade acadêmica de fora, tivemos dois títulos nacionais, vários regionais e estamos disputando a terceira Taça Libertadores da América, mesmo sem a facilidade dos clubes paulistas. O Atlético consegue só 60% do que os clubes paulistas conseguem. Se estivesse em São Paulo, a capacidade de receita seria muito maior. Somos um Estado novo, com muita influência de paulistas e gaúchos, com muito pouco mercado consumidor. Além disso, a maioria do povo brasileiro não está preocupado com o jogo de futebol e sim em ir no supermercado. Claro que é proporcional, mas pode-se chegar próximo ao compromisso com a paixão. Mesmo o que tem dinheiro, acha que alguém vai pagar. Só quer o resultado, não está comprometido com a compra do produto".



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