5 maio 2009 - 11h36

Jornalistas de todo o país analisam a capa da Tribuna

A polêmica capa do jornal Tribuna do Paraná do último dia 27 de abril rompeu as fronteiras do Paraná e virou tema de debate em diversos lugares do Brasil. A Furacao.com entrou em contato com diversos ícones do jornalismo esportivo de todo o país. Nossa reportagem pediu para esses especialistas analisarem o conteúdo do capa do ponto de vista jornalístico. A opinião é quase unânime: a edição passou do ponto do humor para ir para o lado da ofensa, do mau gosto.

O gaúcho David Coimbra, 47 anos, editor executivo de Esportes e colunista do jornal Zero Hora, não gostou do conteúdo. "Não diria que a capa foi ofensiva. Diria que foi de mau gosto", ponderou Coimbra, formado em jornalismo pela PUCRS. A Zero Hora é o sétimo jornal de maior circulação do Brasil e seu editor de esportes sabe bem o que é lidar com a paixão de torcidas, já que reconhecidamente Grêmio e Internacional têm grande rivalidade.

O jornalista Diogo Olivier, 37 anos, repórter especial da ZH, concordou com Coimbra. "Não tinha visto esta capa. Achei de gosto péssimo, jornalisticamente falando e também em relação ao atleta", avaliou Olivier, que tem no seu currículo oito prêmios de jornalismo e cobriu duas Copas do Mundo.

A capa da Tribuna também foi reprovada por Sidney Garambone, 43 anos, formado em jornalismo pela UFRJ, mestre pela PUC-Rio, três livros publicados e uma carreira de mais de duas décadas com passagens por Jornal do Brasil, O Globo, O Dia e IstoÉ. "Achei terrível a capa. Péssimo gosto. Já sou contra o famoso "tomou de quatro", imagine desta forma explícita. Acho que o jornalista foi infeliz ou talvez não tenha percebido como poderia agredir leitores", afirmou Garambone, que participou da cobertura de três Copas do Mundo e atualmente é editor-chefe do Esporte Espetacular, da Rede Globo, e comentarista dos programas Arena Sportv e Bem, amigos!.

Para Sérgio Xavier Filho, 42 anos, diretor de redação da Placar, a mais importante revista esportiva do Brasil, é preciso considerar a linha editorial da Tribuna. O jornalista gaúcho, que já trabalhou no Estado de S. Paulo e na IstoÉ e hoje coordena o projeto Jornal Placar (um veículo recém-nascido com circulação de 80 mil exemplares/dia), considera que a principal função do jornalismo é informar e ajudar o leitor, mas sem deixar de considerar o aspecto comercial. "Bem ofensiva, extremamente. Difícil argumentar contra fatos e fotos. Agora tem um detalhe. É preciso ver o contexto. O jornal é popular, trabalha com uma linguagem direta, agressiva, no melhor estilo tablóide inglês. A capa está dentro desse limite. Para o padrão convencional de jornalismo, é mau gosto puro. Para o padrão popular de jornalismo, é preciso reconhecer: uma capa que funciona na banca", explicou.

Paranaenses também opinam

Entre os jornalistas paranaenses, a avaliação é similar. A Furacao.com entrou em contato com vários profissionais de diversos veículos. Alguns preferiram não se manifestar sobre o assunto.

O jornalista Tiago Pereira, carioca de 27 anos, correspondente do LANCE! no Paraná, chegou até a achar que a capa era uma montagem. "Acredito que passou um pouco do ponto do humor, se a intenção era essa. Assim que olhei a capa achei que era uma montagem ou charge de algum torcedor coxa-branca. Acho que a capa poderia ter sido levada para a festa do Coritiba na Arena, mas com certeza a escolha foi tomada para ter essa repercussão. No entanto, acredito que o jogador deveria ter sido poupado", disse Tiago, lembrando dos efeitos que a capa causou ao atleta Júlio César.

Torcida atleticana recebe panfletos contra a Tribuna foto: FURACAO.COM]


Para Lycio Vellozo Ribas, secretário de redação do Jornal do Estado, o primeiro problema da capa é a diagramação do texto: "Vamos começar pelo mau gosto e pela questão ofensiva. A própria publicação da foto expõe o jogador a uma situação constrangedora. E tudo piora ao se colocar o "4" bem no meio do traseiro. Ouvi um comentário que a Tribuna não inventou a foto, nem o placar de 4 a 2. De fato. Só que isso não justifica, já que a Tribuna editou a capa da maneira que foi publicada, mesmo tendo outras "N" opções possíveis". Do ponto de vista jornalístico, Lycio critica o destaque dado à derrota do Atlético e não à vitória do Coritiba. "Da maneira que o conjunto “foto + manchete” foi publicado, dá a impressão que o Atlético jogou com alguém como o Cruzeiro, o Botafogo, o Goiás. Fora a questão do mau gosto, uma capa dessa forma seria aceitável se fosse contra um time de fora do estado, uma vez que a Tribuna não circula além da Região Metropolitana e Litoral. Mas não. Foi contra o Coritiba, um time que, na ótica de um jornal imparcial, tem o mesmo peso que o Atlético. Trocando em miúdos: a capa desagradou a gregos e troianos. Ofenderam os atleticanos e irritaram os coxas-brancas", comentou o jornalista, que é também editor de Esportes do JE.

O repórter fotográfico Valquir Aureliano, que já trabalhou na Tribuna do Paraná, comparou esta capa à outra polêmica do jornal. "Achei esta capa tão ofensiva quanto uma feita há alguns anos, quando ainda era repórter fotográfico da Tribuna, que se referia a uma derrota do Coritiba após uma sequência de vitórias. A capa dizia: “cai o cabaço alviverde”. Lembro-me que no jogo seguinte os torcedores coxa queriam a nossa pele, ficaram muito revoltados. O mesmo está acontecendo agora. Conheço bem o diretor e o editor do jornal, sei qual a preferência de clubes deles. Mas achei forte pela situação. Poderia usar a mesma foto, mas não com um texto tão apelativo como este. Poderia ser: “Atlético cai de 4 em plena Arena”, com o texto sendo colocado acima da cabeça do Júlio César. Seria normal pela situação, mas no meio das pernas do cara ficou forçado", opinou o fotojornalista.

Debate chega aos bancos universitários

Não é apenas entre torcedores atleticanos ou no universo esportivo do país que a capa da Tribuna do Paraná virou tema de discussões. Nos bancos universitários, professores de diversas disciplinas de Jornalismo discutiram, com alunos e colegas de universidade, a polêmica.

Luiz Paulo Maia, professor de Teoria e ética do Jornalismo na Universidade Federal do Paraná, contou à Furacao.com que não se sentiu ofendido com a foto, mas fez ressalvas quanto ao posicionamento do texto na capa. "Como atleticano, fiquei triste com a derrota, mas não considero a capa ofensiva. Afinal de contas, não perdemos de quatro? E a foto está ótima. Apenas considero ofensiva e desnecessária a colocação do número quatro. A mesma foto com o placar teria o mesmo efeito", explicou Maia.

Para Chico Vargas, professor do curso de jornalismo da Universidade Tuiuti do Paraná, a recente revogação da Lei de Imprensa não pode representar um abuso por parte da imprensa. "Considero a escolha da capa da Tribuna do Paraná de extrema infelicidade, pela exposição desnecessária do jogador Júlio César ao ridículo, por estar de quatro no gramado, e é sabido que isso remete a várias interpretações depreciativas e vexatórias. E, uniformizado, colocou no mesmo patamar a instituição que ele defende e toda sua torcida", criticou Vargas. "Acho que a parcialidade de ocasião é um recurso perigoso quando usado no jornalismo esportivo, principalmente em clássicos do futebol, pois o leitor é passional. Sou partidário, nesses casos, à valorização das qualidades do vencedor, apenas. Boas imagens, títulos e diagramação já são ferramentas suficientes à criatividade e consequente sedução do leitor à aquisição do veículo", concluiu.

Explicações da Tribuna

A Tribuna do Paraná se manifestou sobre o assunto no dia seguinte à capa. O diretor de redação, Rafael Tavares, assinou um texto esclarecendo a elaboração da capa. "Mas não há como negar que a imagem escolhida traduzia o jogo. Não o atleta, mas o Atlético, daquela forma, vestindo um jogador que há tempos vem sendo verborragicamente criticado por muitos dos autores das mensagens que chegaram à Redação. Sim, o Atlético perdeu de 4. No placar, duelando bravamente em campo. E foi este o intento da capa. Resumir na imagem captada o resultado de um jogo surpreendente, sem macular a imagem de quem quer que seja, ferir paixões ou invocar o ódio de torcedores e leitores", defendeu o jornalista.



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