24 jun 2009 - 17h49

Um diferencial chamado Arena da Baixada

Na rua Buenos Aires, em Curitiba, existe um lugar especial. Os desavisados talvez possam confundir esse local com um “simples estádio de futebol”, ou então com um “moderno estádio de futebol”. Mas basta uma observação mais atenta para perceber que se trata de muito mais do que isso. A emoção que pulsa em cada metro quadrado revela: não é um lugar convencional, ultrapassa os limites de um mero estádio de futebol.

Joaquim Américo, Baixada da Água Verde, Arena da Baixada, Caldeirão do Diabo. O nome pouco importa. O certo é que ali, na casa do Clube Atlético Paranaense, cada jogo de futebol é especial, cada partida ganha uma conotação máxima. A participação, o envolvimento e a proximidade do torcedor dão ao estádio uma sensação única de proteção aos atleticanos e temor aos adversários.

Um sentimento reconhecido nacionalmente. “De fato a Baixada não é um estádio convencional. A vaia ali é mais doída. A Baixada é o estádio mais argentino do Brasil, o mais vertical. É como se fossem vários predinhos cercando um campo de futebol, com o agravante de as arquibancadas serem cobertas e o som não ter para onde ir. Da platéia ou do campo, o barulho é infernal. E isso vai piorar quando o lado oposto às cabines de rádio terminar de ser construído. A vaia será ainda mais contundente”, escreveu em 2001 o jornalista Sérgio Xavier Filho na Revista Placar, na reportagem sobre o primeiro jogo da final do Campeonato Brasileiro daquele ano.

E, de fato, a Arena da Baixada é um trunfo, um diferencial para o Atlético Paranaense. Foi ali, jogando em sua moderna casa, que o clube viveu seus momentos mais gloriosos na história: três participações na Libertadores da América, dois títulos de nível nacional (Seletiva, em 1999, e Brasileiro, em 2001), um vice-campeonato nacional (Brasileiro 2004) e um vice-campeonato da Libertadores, em 2005. Feitos, conquistas que contaram com a participação (muitas vezes decisiva) do “fator Arena”. Os números comprovam: o aproveitamento do Atlético jogando na Arena da Baixada é de cerca de 70% dos pontos disputados.

Cem mil vozes

A percepção de que a Arena da Baixada é diferente não é apenas dos espectadores. Os próprios atletas que atuaram no estádio revelam que jogar neste estádio é uma experiência fora do comum. "A torcida do Furacão é diferenciada, é fantástica. Sempre por onde passo falo e repito que jamais senti emoção tamanha de escutar a nação atleticana gritando meu nome na Arena. É indescritível a emoção! Por isso, a Arena tem um diferencial, exatamente pela força que a torcida dá ao time, pela vibração que tem e pelo coração que cada um deles coloca dentro de campo para torcer e ajudar o seu time até o final", declara o volante Cocito, que atuou pelo Atlético na Arena entre 99 e 2002 e em 2005.

Os jogadores adversários "sentem" a pressão de enfrentar o Furacão na Arena. Os pentacampeões mundiais Edilson e Vampeta já admitiram que ficaram intimidados com as "caveiras" da Fanáticos agitando o Caldeirão. O zagueiro Marcão, hoje no Palmeiras, diz que o público parece multiplicado na Arena: "Jogar na Arena contra o Atlético é muito difícil pela pressão exercida pela torcida, que motiva e empurra qualquer jogador. A acústica do estádio faz que 20 mil vozes se tranformem em 40, 50, 100 mil vozes. Com certeza, a Arena e a torcida, que tem como maior característica não desistir nunca, são dois fatores que deixam o Atlético muito forte".

A força da Caveira na Arena [foto: Giuliano Gomes]


O goleiro Diego, vice-campeão da Libertadores em 2005, destaca o que sofrem os adversários quando jogam na Arena: "São muitas dificuldades. A principal de todas é que a Arena da Baixada é um verdadeiro Caldeirão. Existe uma mística em torno desse estádio, que somado à presença e participação apaixonada do torcedor rubro-negro e seu incansável grito de incentivo, contagia atletas do Atlético e certamente intimida o adversário. A Arena é o melhor estádio de se jogar para os atletas do Atlético e o pior e mais assustador para o adversário".

Paulo Rink, já aposentado, lembra-se com carinho dos bons momentos que viveu no Joaquim Américo. Ele atuou várias vezes na antiga Baixada e sua negociação para o Bayer Leverkusen foi essencial para a construção da Arena da Baixada. Em 2005, ele voltou ao clube para encerrar sua carreira e teve a oportunidade de disputar alguns jogos na Arena: "É realmente um Caldeirão. É muito difícil definir, mas é muito fácil sentir. Quem vem a campo sabe como é".

Fator Arena

Para o jornalista Diogo Olivier, da Zero Hora, a força da Arena se manifesta mais em jogos contra times menores do que contra as grandes equipes. "Jogar fora de casa é sempre mais difícil. No caso da Arena da Baixada, tem a questão da proximidade do campo e do formato do estádio, algo próximo da Bombonera. A pressão é maior. Mas, entre clubes grandes, eu relativizo o fator local. Equipes acostumadas historicamente a decidir tendem a não tremer longe de seus domínios. Assim, se Cruzeiro, São Paulo ou Flamengo podem ir a Curitiba e vencer o Atlético, o Furacão vai ao Mineirão, Morumbi e Maracanã e faz o mesmo com naturalidade. A diferença existe, aí sim, é contra times médios e pequenos. O São Caetano, por exemplo, claramente, sentiu o peso da torcida e aquele clima todo", pondera o jornalista gaúcho.

Para Gil Rocha, diretor de esportes da RPC, a Arena da Baixada por vezes compensa a deficiência da equipe, tamanho o seu peso. "A pressão é realmente forte. Por vezes o time do Atlético nem precisa estar tão bem em campo, que a torcida compensa", afirma Gil, que trabalhou em vários jogos do Atlético na Arena ao longo desses dez anos.

Torcida pressiona mais na Arena [foto: arquivo]


Por outro lado, o colunista Carneiro Neto, da Gazeta do Povo, acredita que o "fator Arena" só funciona justamente quando o time do Atlético é forte. "O chamado Efeito Arena, que é a pressão exercida pela torcida sobre os times que visitam a Arena da Baixada, só é sentido quando o Atlético conta com uma equipe forte, com jogadores talentosos e plano tático adequado, que são os ingredientes imprescindíveis para o dono da casa fazer valer o fator campo. Ao contrário, quando atravessa momento técnico de menor inspiração, a pressão da torcida acaba funcionando de forma contrária como, aliás, ocorre com todos os times de massa nas mesmas circunstâncias", observa Carneiro. De acordo com o colunista, a excelente fase do Rubro-Negro na última década contribuiu para criar a mística da Arena. "Como na média dos últimos dez anos o Atlético conseguiu formar bons times a imagem que se consagrou foi a de que se ingressa em autêntico Caldeirão, quando o visitante pisa o gramado da Arena da Baixada para enfrentar o Furacão", afirma.

A opinião de Carneiro Neto é compartilhada pelo professor Valério Hoerner Júnior, especialista na história do Atlético. "Em princípio, o fator Arena é importante. Entretando, depende ele da dedicação e da entrega do grupo de atletas. Atualmente, o grupo não é bom e há divisões internas, fruto talvez da falta de experiência do presidentee mandatários de um modo geral. Na equipe, alguns supostos líderes entendem por jogar para eles somente, prejudicando o grupo atuante. Entretanto, quando há um grupo como o de 2001 ou o de 2004, todos focados num só objetivo, o fator Arena foi fundamental. Aquele que seria o nosso segundo campeonato brasileiro ganhou quase todas dentro do Joaquim Américo. Veio a tragédia de Erechim, com o Levir Culpi botando os pés pelas mãos. Entretanto, nesse ano, quem ia jogar na Arena já entrava tremendo, pois as estatísticas eram aterrorizadoras. Isso tudo em face da torcida geral e da organizada, que faz tremer o estádio. Mas se os jogadores forem refratários a isso, o que anda acontecendo hoje em dia, de nada adianta. Tem de haver um absoluto entrosamento de vontades e de responsabilidades", conclui Valério.



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