23 dez 2011 - 4h13

As recordações da psicóloga Suzy Fleury

Para a fase final do Campeonato Brasileiro de 2001, a diretoria e a comissão técnica resolveram organizar um planejamento com o objetivo de conquistar o título. A primeira providência foi determinar a permanência de todo o elenco no CT do Caju em regime de concentração durante todos os jogos da fase decisiva. Outra preocupação do clube foi com o lado psicológico dos atletas. Para isso, o Atlético contratou Suzy Fleury, ex-psicóloga da Seleção Brasileira, que deu o apoio necessário para que eles pudessem suportar a pressão dos jogos, realizando trabalho motivacional, atendimentos individuais e dinâmicas de grupo.

Sua chegada ao Atlético aconteceu em setembro daquele ano, por intermédio do técnico Geninho, que havia assumido a equipe com a demissão de Mário Sérgio. O momento era crítico. O Rubro-Negro estava em 13º lugar e a torcida insatisfeita, ainda mais depois que a imprensa começou a noticiar que alguns jogadores estavam na “noite”, gerando um mal estar no clube.

O trabalho foi difícil, jogo a jogo, jogador a jogador. Suzy teve papel fundamental para motivar o grupo e dar o suporte para que Geninho pudesse conduzir a equipe ao tão sonhado título. Antes do jogo contra o São Paulo, por exemplo, ela reuniu todos os jogadores e passou um vídeo com músicas, jogadas bonitas e muitos gols, e disse que a cada jogo que o time vencesse, ela iria aumentar o número de jogadas no vídeo. “Todo mundo se emocionou com aquilo. Ficamos arrepiados”, lembra o ex-zagueiro Rogério Corrêa.

Com pós-graduação em marketing e um mestrado em psicologia do esporte em Madri, Suzy começou a atuar como psicóloga de equipes de futebol em 1993, quando conheceu o técnico Vanderlei Luxemburgo, que estava assumindo a equipe do Palmeiras naquela oportunidade. Trabalhou em clubes como Corinthians e São Paulo, e também teve passagem pela Seleção Brasileira durante as Olimpíadas de 2000. Desde 2003, a psicóloga comanda a Academia Emocional, onde atende atletas e executivos com sessões individuais de coaching, além de desenvolver trabalhos com clubes esportivos e empresas.

Confira abaixo a entrevista exclusiva que Suzy Fleury concedeu à Furacao.com, em que destacou o entrosamento e comprometimento da equipe campeã, o relacionamento com Geninho e várias histórias de bastidores:

O convite
“Tenho recordações com detalhes porque foi um ano de muito trabalho, de muito desafio, mas uma realização muito grande. Além do trabalho realizado com o Atlético Paranaense, também estava fazendo a minha especialização em Madri em Psicologia do Esporte e no meu trabalho final de conclusão documentei todo o trabalho sob o ponto de vista psicológico. Foi uma experiência muito rica porque o Atlético estava em um momento difícil quando o Geninho assumiu, na 13º posição. Lembro bem porque naquela época eu estava no Atlético-MG, que estava em terceiro, e estava me desligando de lá porque a diretoria deles exigiu que eu morasse em Belo Horizonte por conta das despesas de translado e hospedagem, até porque eu continuo tendo a minha base em São Paulo. Aí durante um almoço com o Levir Culpi, quando estava agradecendo e me despedindo, uma hora depois o Geninho me ligou perguntando se eu aceitaria trabalhar com ele no Atlético na reta final, que os trabalhos psicológicos e motivacionais seriam muito importantes”.

Atlético: momento turbulento
“Quando cheguei o Atlético estava em uma situação muito ruim perante à imprensa e à torcida. Quando o Mário Sérgio entregou o cargo revelou que os atletas estavam na noite e aquilo criou um atrito muito forte, e a diretoria chegou a afastar alguns atletas. Aí o Geninho assumiu e inclusive bancou a permanência desses jogadores, foi um ato de coragem dele porque ele estava assumindo a responsabilidade de ficar com o mesmo elenco. Foi um trabalho de formiguinha, jogo a jogo e com cada jogador. O Geninho sempre me passava os pilares da próxima partida e o esquema tático. Lembro que o Kleberson vinha trabalhando forte, tinha jogado praticamente todas as partidas com muita regularidade, o Nem chegou a integrar uma lista de dispensas por causa das declarações do Mário Sérgio, enfim, foi um momento de muita aprendizagem”.

Aprendizado
“A maior lição daquele trabalho no Atlético foi que uma equipe sem estrelas conseguiu se transformar em um time muito competitivo, onde um dava cobertura para o outro. Vimos uma equipe trabalhando e o coletivo sempre imperando. E foi em cima disso que ganhamos. Com quatro rodadas a gente já tinha o sentimento que seria muito difícil perder aquele título em função do grau de entrosamento e do comprometimento dentro de campo. Foi um momento muito bonito na minha carreira e na minha trajetória. Tenho muito mais lembranças e prazer em lembrar do que vivi no Atlético do que a minha trajetória na Seleção Brasileira durante dois anos”.

Dificuldades
“Quem viveu aquele campeonato sabe o que passamos, todas as dificuldades que tivemos, mas que conquistamos o título com muito sacrifício e aprendizagem. Montamos um time coletivamente trabalhando e conseguindo resultados”.

Preleção com faixas de campeão
“O Geninho sempre tinha essa convicção, de que o time esta coeso, jogando bem e convencendo, se posicionando realmente como uma equipe que tinha muitas possibilidade de se consagrar se campeã. Aí no jogo contra o São Caetano, o último, programamos um exercício com dinâmica de grupo antes da partida. Era um quebra-cabeça que eles tinham que montar, mas faltava uma peça. Passou um tempo e nada deles encontrarem a última. Aí um jogador deduziu, o qual não me recordo agora o nome, que a peça que faltava era o título. Passamos a penúltima parte do vídeo motivacional e tinha uma mensagem no final que “o show tem que continuar’, justamente para poder fechar aquela trajetória. Quando o vídeo terminou, o Geninho abriu uma caixa com as faixas de campeão e começou a distribuir entre os atletas. Ele dizia: “Olha, essa faixa pode ser nossa ou pode ficar apenas como recordação”. E naquele momento um olhava pro outro e foi um momento de muita emoção. Eu digo que sou preparada para fazer todo esse trabalho, mas naquele momento não teve jeito. Chorei muito, tem várias fotos minhas com o rosto inchado de tanto chorar. A gente tinha a convicção de que iríamos conseguir, que o time ia entrar e sair de campo campeão. Fora isso, no translado do hotel para o estádio, na ida, a gente via trio elétrico na rua, ficamos sabendo que tinha um show todo encomendado para a festa deles. Mas aquilo não nos intimidou, o time todo estava muito concentrado”.

Tristeza
“O único fato triste foi que jogamos no dia 23, fomos para o aeroporto e o voo atrasou demais. Os jogadores embarcaram lá pelas 3h. Ou seja, já era véspera de Natal, e quem ia ver família já teve que se deslocar ali mesmo. Acabei não participando, assim como outros jogadores, de toda aquela festa”.

Lembranças
“Depois daquele ano, muitos jogadores saíram do Atlético e deram continuidade às suas carreiras, e hoje estão aí com muitas histórias pra contar. Gosto muito de relembrar aquele ano e acabo revivendo tudo também. O Atlético é um clube grande que precisa e merece muito mais títulos”.

Bastidores
“Um ano antes de chegar ao Atlético eu tinha participado das Olimpíadas de 2000, com a Seleção Brasileira, e quando o Geninho me convidou eu estava me desligando do Galo, que estava em terceiro lugar naquele Brasileiro. Logo quando cheguei, reuni a diretoria, o Geninho e o Riva e fiz a apresentação de como seria o trabalho psicológico com o grupo. Perguntei qual era o objetivo do Atlético naquela campanha e o presidente disse: “Se chegamos em terceiro já me dou por satisfeito”. Aí respondi que o terceiro lugar não me interessava, porque eu tinha perdido uma Olimpíada e não tinha como trabalhar e lutar pelo terceiro lugar, que só me interessava pelo primeiro. Aquilo causou um constrangimento e uma confusão entre eles. Um começou a dizer para o outro: “Está vendo? Você pensa pequeno!” Enfim, olhei para o Geninho, saímos da sala e deixamos que eles definissem o que seria feito. Voltamos para a sala e eles disseram que sim, o clube lutaria pelo título. Aquilo fez toda a diferença porque algumas decisões importantes precisavam ser tomadas, além de outras atitudes para que todo mundo estivesse focado em busca de um único objetivo. E conseguimos”.



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