Marcus Coelho: “A torcida do Atlético é o seu maior bem”
Marcus Coelho foi presidente do Atlético por um ano. Durante sua gestão, o clube conquistou o bicampeonato paranaense e campeonato brasileiro, a principal conquista do Atlético em toda a sua história. Apenas essas duas conquistas são suficientes para expressar a passagem de Coelho pela presidência.
Nascido em Tubarão, Marcus Aurélio Coelho mudou-se para Curitiba em 1965 e foi morar perto do Estádio Joaquim Américo. A paixão pelo Atlético foi instantânea. Passou a acompanhar todos os jogos do clube e virou um rubro-negro fanático. Formou-se Bacharel em Direito e se tornou advogado. Na década de 70, foi convidado para integrar o Conselho Deliberativo do Atlético. Desde então, participou da vida política do clube exercendo todos os cargos, incluindo o de vice-presidente e o de presidente do Conselho. Integrou também, por mais de uma vez, o Comitê Gestor do clube, auxiliando especialmente na área jurídica. Foi, por sinal, um dos responsáveis pela alteração do Estatuto do clube, a partir do qual se implantou o sistema de administração através do Comitê Gestor. Além disso, teve participação direta a favor do clube no caso da suspensão imposta pela CBF, em 1997.
Na sua gestão, o Atlético teve quatro técnicos: Paulo César Carpegiani, Flávio Lopes, Mário Sérgio e Geninho. Foram contratados jogadores que marcaram história no clube, como Alex Mineiro, Souza e Nem. Foi um presidente atuante e esteve presente no dia-a-dia do time de futebol, conversando com os jogadores e resolvendo toda a sorte de problemas. Deixou a presidência logo depois da conquista do título brasileiro, mas não parou de acompanhar o clube. Faz questão de ir a todos os jogos, torcer e vibrar pelo seu Atlético.
Nesta entrevista exclusiva concedida por e-mail à Furacao.com, Marcus Coelho revela a previsão que Geninho fez após a partida contra a Ponte Preta, dizendo que a equipe chegaria à final com o São Caetano, destaca a festa da torcida atleticana, contratação e manutenção de jogadores, além do equilíbrio daquele grande time. Registro minha admiração e eterna gratidão a todos eles.
Qual é a sua melhor recordação do título de 2001?
As festas da torcida nos jogos decisivos. Acordei muitas noites de minha vida com essa doce lembrança. Sou feliz e grato por isso. A torcida do Atlético é o seu maior bem. Ela é única e apaixonada. Nada e nenhuma outra é melhor do que ela.
Como foi o processo que o conduziu à presidência do Atlético? Era um projeto pessoal seu ou aconteceu por acaso?
Havia duas CPIs do futebol brasileiro instaladas na Câmara dos Deputados e no Senado Federal. Entenderam, por conta disso, que o Atlético deveria ser dirigido por um advogado e aí fui convidado. Além disso, havia acabado de exercer a presidência do Conselho Deliberativo e tinha experiência por ter participado da defesa do clube no caso Ivens Mendes, em 1997. A presidência não era um projeto pessoal. Minha vontade à época era ajudar o Atlético em qualquer um dos segmentos internos por um período de tempo, pois sempre entendi que esse é um dever de todo o atleticano.
Honestamente, o sr. imaginava ser o presidente no ano da conquista do maior título da história do clube?
Quando iniciou o mandato, não. Todos apenas queriam que clube fosse conduzido serenamente naquele ano das CPIs. Mas com o passar do tempo as coisas mudaram, os profissionais fizeram um trabalho muito competente e logo passamos a acreditar no título. A partida entre o Furacão e a Ponte Preta, realizada em Campinas, foi a prova concreta de que poderíamos ganhar o título. A partir daquele dia, o título passou a ser uma certeza para mim.
Alguns comentam que o sr. era uma espécie de “rainha da Inglaterra”. Ou seja, ostentava um título, mas quem exercia o poder de fato e tomavas as principais decisões era Mario Celso Petraglia. Isso procede?
Essa é uma das típicas maldades do futebol, seguramente derivada da inveja. As pessoas não devem acreditar nas versões de oportunistas e fraudadores da história. Se o Atlético, ao contrário de ser campeão em 2001, tivesse sido rebaixado, pode ter certeza de que eu apareceria como o único responsável pela queda. Mas essa é a vida e temos que vivê-la.
O sr. tomava decisões na área do futebol? Decidia a contratação de técnico e jogadores?
As decisões no Atlético naqueles tempos eram tomadas por um grande colegiado. Foi o maior exercício de democracia de que tive oportunidade de participar. Mas houve momentos em que decidi isoladamente. Um deles foi a contratação do Souza. Outro momento, atendendo a um pedido do técnico Geninho, foi a manutenção do Nem em nosso elenco. Penso que foram decisões acertadas. Também defini a necessidade de contratação da psicóloga Suzy Fleury. Ela foi fundamental na nossa conquista e fez um trabalho de vanguarda para o futebol da época.
O Atlético fez um planejamento específico para conquistar o título brasileiro ou as coisas encaixaram e o time chegou? Se houve um planejamento, como foi?
O Atlético de então, antes mesmo de 2001, fazia um trabalho exemplar de planejamento. Todos os anos jogadores saíam e seus substitutos normalmente já estavam acertados. Havia também a questão da comissão técnica permanente. Contratávamos apenas os treinadores.
O sr. participava do dia a dia do futebol? Ia aos treinos, acompanhava as preleções, costumava frequentar os vestiários em dias de jogos?
Sempre, muito embora tivéssemos os responsáveis por essa área (Ademir, Samir, Carletto e Valmor). Costumava ir aos vestiários até mesmo nos intervalos dos jogos.
Como foi o episódio da saída do Mário Sérgio no meio da competição? Ele pediu para sair, depois voltou atrás e aí acabou saindo mesmo. Por que ele deixou o clube e quem tomou essa decisão?
Houve um problema nos vestiários após um dos jogos. No dia seguinte já estava superado, mas ficou o desgaste. Gostaria de dizer que admiro Mário Sérgio. Trata-se de uma pessoa inteligente e amigo do Atlético.
Qual era a principal qualidade do time de 2001? Qual jogador o sr. mais admirava naquele grupo?
O equilíbrio. Tínhamos bons jogadores em todos os setores. Registro minha admiração e eterna gratidão a todos eles.
Houve algum momento particular na campanha de 2001 em que o Sr. percebeu que a equipe faria não apenas uma boa campanha, mas de fato era um concorrente real ao título?
Como disse antes, foi no jogo contra a Ponte Preta. Fizemos uma partida memorável. Goleamos nosso adversário em sua própria casa. Depois do jogo nosso capitão Nem reuniu os jogadores e reafirmou que déramos a prova definitiva de que poderíamos ser campeões. Logo após, já de volta ao hotel onde estávamos concentrados, Geninho fez a mim uma previsão: Iremos às finais e será contra o São Caetano, na cidade de São Caetano. Iremos ganhar, já que nunca perdi uma partida para eles. Forçarei as jogadas pelo meio da zaga. Elas resultarão em gol ou pênalti. A história provou que ele, além de excelente técnico, é um grande vidente.
Qual é o aspecto mais difícil de ser presidente de um clube de futebol?
O ajuste das opiniões divergentes. Há que se ter muita paciência para ouvir e administrar os conflitos.
Em qual jogo o sr. ficou mais nervoso naquela campanha?
Em todos! Mas os minutos finais do jogo decisivo foram os mais tensos.
Como foi a comemoração pela conquista do título? Houve alguma festa dos jogadores, funcionários e dirigentes?
As comemorações foram prejudicadas pela data da conquista, dia 23 de dezembro, às vésperas do feriado de Natal. Ao final, todos queriam seguir para suas casas. Entretanto, a festa feita por nossa torcida foi fantástica, superou tudo o que pudéssemos ter feito.
Há algum episódio de bastidores daquela campanha que o sr. pode revelar para a torcida hoje, passados dez anos do fato?
Boa parte deles já são do conhecimento de todos. Passam pela contratação do nosso ídolo Alex Mineiro, que veio por conta de que o atleta Paulo Isidoro, o escolhido, eticamente nos alertou sobre uma persistente contusão; pelas avaliações da psicóloga Suzy Fleury que apontavam Alex Mineiro como o atleta que seria destaque nos jogos decisivos (ela nos disse que Alex era um atleta que tinha gosto especial por jogos difíceis); pelo ambiente de família que existia no CT do Caju, seja entre jogadores, comissão técnica e funcionários (a comissão técnica, mais Bolinha, Edilson Thiele, Valmor e eu nos reuníamos para confraternizar sempre às segundas-feiras na casa do Cordeiro. Eram reuniões memoráveis entre esses grandes profissionais e atleticanos).
Por que o sr. decidiu se desligar do Atlético logo depois da conquista do título?
Acredito que ninguém pode se perpetuar no poder, especialmente em clubes de futebol. O poder prolongado é a base de muitos vícios.
Por que o sr. nunca mais participou ativamente da política do clube, a não ser recentemente?
Para deixar bem claro de que não pactuo com o continuísmo. Nas últimas eleições participei mais ativamente para atender pedidos de velhos amigos e de uma fantástica nova geração de atleticanos que pretende ajudar o nosso clube. Entendi que podia fazer isso, após dez anos de afastamento proposital.
Na sua opinião, por que o Atlético não conseguiu repetir a conquista do título brasileiro nos dez anos seguintes?
Porque o poder voltou a ser concentrado em uma só pessoa. Nesse caso, a possibilidade de erro é enorme. Várias cabeças pensam muito melhor do que uma, ainda mais quando essa está sob pressão decorrente de maus resultados. A conquista do título de 2001, sob o ponto de vista de gestão do clube, foi uma obra coletiva. Todos colaboraram ativamente, cada qual em seu setor, para que o objetivo fosse alcançado. Nossas reuniões, muitas das vezes, contavam com mais de dez colaboradores. Democracia plena, à serviço do clube e de suas conquistas! Deixo aqui o meu agradecimento a todos os que participaram daquele momento histórico.
Na penúltima partida da primeira fase, o Atlético foi extremamente prejudicado pela arbitragem em uma partida contra o Guarani, pelo sempre polêmico Wilson Souza de Mendonça. O sr. saiu extremamente irritado de campo. Vocês da diretoria, temiam pela arbitragem na reta final do campeonato? Chegaram a conversar sobre esse assunto com a CBF?
Aquela arbitragem foi mesmo desatinada. Levamos nossa preocupação aos responsáveis pela CBF. Todo o dirigente de futebol teme a arbitragem. Ela é uma parte muito sensível no esporte. Pode em um único lance prejudicar e até mesmo destruir todo o trabalho feito ao longo de anos.