Festa para o Rei Negro

Há 72 anos, nascia um menino negro, pobre, brasileiro, mineiro e tricordiano. Sábia natureza, somente três corações poderiam suportar as emoções que a vida iria reservar a esse menino. Foi chamado de Edson – em homenagem a Thomas Alva Edison (1847 – 1931) inventor norte-americano nascido em Milan, Ohio, que registrou 1.093 patentes de inventos, dentre os quais a lâmpada incandescente, sua criação mais famosa.

Ao nome Edson foram acrescentados os apelidos de Família: Arantes do Nascimento e depois a vida se encarregaria de lhe acrescentar outros apelidos. Primeiro, gasolina; depois, Pelé; e ainda mais: Rei, Gênio, Atleta do Século, Cidadão do Mundo e tantos outros adjetivos e substantivos equivalentes, em todas as línguas que se possa imaginar. Esforço vão: não há palavra conhecida que possa definir Pelé.

Há exatos 72 anos – no dia 23 de outubro de 1940, em plena Segunda Grande Guerra Mundial – nascia em solo brasileiro um menino negro, pobre, mineiro e tricordiano predestinado a ser Rei. Em 23 de outubro de 1940, nasceu brasileiro o menino que iria encantar o Mundo jogando o seu futebol.

Há 72 anos, nasceu no Brasil um menino negro que ganhou dos pais o nome Edson em homenagem ao gênio norte-americano e que se revelaria gênio muito maior do que o célebre xará inventor da lâmpada.

O menino Edson Arantes do Nascimento começou a jogar futebol desde cedo. Aos 10 anos já brincava com a bola em times de pelada, um deles se chamava Ameriquinha. O pai de Pelé – seu Dondinho, que era um boleiro de corpo e alma – vendo a vocação do menino o estimulou a montar seu próprio time: nascia o Sete de Setembro, de Bauru.

Para adquirir material, como bolas e uniformes, os garotos do time vendiam produtos na entrada do cinema e nas praças e Pelé trabalhava como engraxate para ajudar a levantar os tais recursos a serem aplicados no Sete de Setembro (essa fase da vida de Pelé inspirou o lírico curta-metragem “Uma História de Futebol” que deve ser assistido por todos os amantes do rude esporte bretão. Para tanto, deixo aqui o atalho http://www.portacurtas.com.br/Filme.asp?Cod=1349).

Aos 11 anos, Pelé foi descoberto pelo jogador Waldemar de Brito e veio a ser convidado a jogar no Bauru Atlético Clube, o BAC, ou Baquinho, como era carinhosamente chamado. O mesmo Waldemar levou Pelé ao Santos, no dia 8 de agosto de 1956, dizendo: ‘Esse menino vai ser o melhor jogador de futebol do mundo’. Assim começou a carreira de Pelé no Santos F.C., estreando em uma partida amistosa cujo resultado foi Santos 7 x 1 Corinthians de Santo André (com um gol de Pelé).

Aos 16 anos, Pelé participou de um torneio de quatro equipes europeias e brasileiras. O time em que atuou foi um combinado do Santos e do Vasco da Gama e, em uma das partidas, ele fez três gols.

A consagração do menino-rei veio na Copa do Mundo da Suécia, em 1958, quando o Brasil foi pela primeira vez campeão mundial. Pelé, o artilheiro da Seleção brasileira na Copa, marcou seis gols e se sagrou campeão com apenas 17 anos.

Na Copa do Chile, em 1962, Pelé sofreu uma distensão muscular no jogo contra a Tchecoslováquia e deu adeus ao torneio, deixando Garrincha brilhar.

Pelé participou ainda da Copa de 1966, na Inglaterra, e da Copa de 1970 no México, quando a seleção trouxe para o Brasil o Tricampeonato Mundial e a taça Jules Rimet, em definitivo (ou pelo menos era para ser em definitivo, pois ninguém contava com o furto da Taça em 1983).

Apelidado de ‘O Rei’ pela imprensa francesa, Pelé criou e aperfeiçoou jogadas que encantaram o mundo: o chute a gol do meio do campo, a tabela nas pernas do adversário, o drible sem bola no goleiro, a paradinha na cobrança do pênalti.

Em 1969, em meio à guerra civil no Congo Belga, as forças rivais declararam uma trégua para que Pelé e o time do Santos F.C. transitassem em segurança entre Kinshasa e Brazzaville. Ainda em 1969, Pelé marcou seu milésimo gol: era 19 de novembro de 1969, exatamente às 23h11, quando o goleiro Andrada foi inapelavelmente fuzilado pelo Rei Pelé.

Assim, na 909ª partida de sua carreira, num jogo que terminou Vasco 1 x 2 Santos, Pelé se tornava, oficialmente, o primeiro jogador da história do futebol mundial a assinalar 1.000 gols como profissional. Cercado pelos repórteres, Pelé disse: ‘Pensem no Natal. Pensem nas criancinhas’.

Pelé vestiu uma camisa de número 1.000 e deu a volta olímpica no Maracanã que, em transe, aplaudia o Rei do Futebol, irmanando em suas dependências torcedores das mais diversas agremiações.

Em 2007, o atacante Romário marcou, por sua contagem, o milésimo gol, mas o feito não teve a mesma repercussão do milésimo gol de Pelé, pois, como antecipara o poeta e vascaíno Carlos Drummond de Andrade: “Difícil não é fazer mil gols como Pelé; difícil é fazer um gol como Pelé”.

Pelé fez a última partida pelo time do Santos na noite de 3 de outubro de 1974 – foi no jogo Santos 2×0 Ponte Preta – e nessa noite protagonizou uma das cenas mais emocionantes da história do futebol mundial: aos 21 minutos do primeiro tempo de jogo, Pelé segurou a bola com as mãos, ajoelhou-se no meio do gramado, abriu os braços agradecendo a Deus e, voltando-se aos quatro cantos do estádio Urbano Caldeira, saudou, em prantos, os torcedores presentes.

Depois, transferiu-se para o New York Cosmos em 1975, fechando a maior transação do futebol até o fim dos anos 1970 (US$ 7 milhões). A última partida pelo time americano foi um New York Cosmos 2 x 1 Santos, no Giants Stadium (Nova York), em 1º de outubro de 1977. Pelé atuou um tempo por cada equipe.

Em 1997, dezesseis anos depois de ser eleito o “Atleta do Século”, Pelé recebeu o título de Sir-Cavaleiro Honorário do Império Britânico, das mãos da Rainha Elizabeth-II (e naquele momento era impossível dizer em que corpo corria o sangue mais azul).

Até hoje, quando surge no futebol brasileiro ou mundial algum guri habilidoso, alguém – normalmente um idiota – se apressa em afirmar “É o novo Pelé”. Foi assim quando surgiu Maradona (este já amplamente superado por Messi), foi assim com Denner, com os Ronaldos, com Diego, com Robinho, com Ganso, com Neymar.

Até hoje, quando surge no futebol brasileiro ou mundial um guri habilidoso, alguém – normalmente um idiota – se apressa em criar uma comunidade no Orkut afirmando “Não vi Pelé jogar, mas vi Robinho” como se ver Robinho pudesse compensar os olhos daqueles que não viram Pelé, como se ver Robinho fosse exatamente a mesma coisa.

Pobres idiotas: quem viu Pelé em campo até hoje não acredita; quem ainda não viu terá dificuldades em acreditar. “Não me venham falar em Di Stéfano, em Puskas, em Sivori, em Suárez. Eis a singela e casta verdade: não chegam aos pés de Pelé. Quando muito, podem engraxar-lhe os sapatos, escovar-lhe o manto” (Nelson Rodrigues).

Até hoje, a grande verdade é que nunca mais o mundo – e especificamente o mundo do futebol – vai assistir a um espetáculo como o que foi protagonizado, ao longo da vida, por um menino negro, pobre, brasileiro, mineiro, tricordiano, nascido há exatos 72 anos e que foi chamado de Edson, em homenagem a Thomas Alva Edison, num longínquo 23 de outubro de 1940, época em que ainda ninguém podia imaginar que o gênio, ali, era o menino pretinho, recém-nascido, nascido para reinar e que, superando as 1.093 patentes de inventos de Thomas Alva Edison, inventou 1.281 obras-primas as quais, modestamente, resolveu chamar de gols!

Parabéns, Amigo Pelé! Você não é de Três Corações, você não é de Santos, você nem é do Mundo, você pertence a Deus!

P.S.: E o Janguitão vai sacudir, no 72º Aniversário do Rei, pois o Furacão vai passar por cima do Guarani. Atlético Paranaense de volta à Elite, lugar que lhe é de direito desde sempre e para sempre!