A Justiça do Trabalho concedeu pedido de liminar formulado pelo Atlético para reconhecer que o meia Nathan assinou um contrato de cinco anos com o clube. Isso significa que o vínculo do jogador com o Furacão agora vai até 31/03/2017, o que o impede de celebrar um pré-contrato com outro clube.
No mês passado, o Atlético ajuizou uma ação contra o atleta Nathan Allan de Souza, revelado nas categorias de base do clube e que atualmente integrando o elenco profissional. O objetivo do clube era fazer valer um contrato assinado em 2012, quando Nathan tinha 16 anos.
A legislação brasileira permite que um atleta assine o primeiro contrato profissional pelo prazo de cinco anos. Mas a FIFA somente dá condições de jogo se o contrato tiver prazo de três anos. Por isso, tem-se adotado a prática de celebrar um contrato de três anos com prorrogação automática de mais dois, bastando a notificação de uma das partes.
O Atlético pretende manter o meia Nathan em seu elenco. Desde o ano passado, a diretoria vem negociando com o jogador e seus procuradores, sem chegar a um acordo. O pai de Nathan sustenta que a cláusula contratual de prorrogação é inválida, e por isso o vínculo terminaria no próximo ano. Desse modo, Nathan poderia se transferir para outro clube sem que o Atlético recebesse nada.
Confira abaixo a íntegra da decisão proferid pela Juíza do Trabalho Karina Amariz Pires, da 15ª Vara do Trabalho de Curitiba:
Vieram os autos conclusos em razão do requerimento da parte autora de antecipação dos efeitos da tutela, a fim de que seja declarada a legalidade automática do contrato de trabalho especial, prevista na cláusula 16 do contrato.
Esclarece que "para que a prorrogação ocorresse era necessária apenas a tempestiva notificação de uma das partes pela outra parte, ocorrendo a referida prorrogação de forma automática, isto é, sem que seja exigida uma nova manifestação de vontade da parte notificada, na medida em que referida manifestação de vontade já fora externada, de forma explícita e sem deixar qualquer margem à dúvida, quando da assinatura do contrato." (fls. 5)
O réu instado a se manifestar informou que a claúsula (sic) é nula, uma vez que atleta Nathan era menor de idade estando com 16 anos à época, quando da assinatura do contrato, e portanto com vício de vontade; afirma que a cláusula é puramente potestativo, pois basta que o clube notifique o atleta para que este se sujeite as regras impostas.
Passo a analisar as questões expostas.
Para tanto, abaixo reproduzo a cláusula 16 do contrato que está sendo objeto de discussão processual.
"16.1 Neste ato, JOGADOR e CLUBE manifestam sua vontade de estabelecer um vínculo contratual e desportivo pelo prazo de 5 (cinco) anos, permitido pelo artigo 30 da Lei 9615/98. Todavia, em razão de regra imposta pela FIFA e visando a obtenção de acessória condição de jogo, as partes ajustam inicialmente um prazo de 3 (três) anos (01.04.2012 a 31.03.2015) com prorrogação automática por 2 (dois) anos adicionais (até 31.03.2017). (…)
16.2. Para que a prorrogação entre em vigor, qualquer das PARTES (JOGADOR ou CLUBE) deverá notificar a outra (CLUBE ou JOGADOR), por escrito, entre 01.03.2014 e 01.05.2014, bem como notificar a Confederação Brasileira de Futebol ¿ CBF, por escrito, entre 01.03.2014 e 01.05.2014. A Parte que enviou a notificação fica designada como PARTE NOTIFICANTE e a outra como PARTE NOTIFICADA.
16.3. Tendo uma das PARTES (JOGADOR ou CLUBE) promovido a notificação da outra e da Confederação Brasileira de Futebol – CBF dentro dos prazos previstos acima, a outra PARTE não poderá se opor à prorrogação automática. Será então levado a registro na Confederação Brasileira de Futebol – CBF um Termo Aditivo Contratual ou Novo Contrato Especial de Trabalho Desportivo, prevendo a prorrogação do prazo e as demais condições descritas na Cláusula 16.1."
Inicialmente, urge salientar que a regra acima está incluída em contrato de trabalho especial desportivo, com registro perante a CBF, conforme exigência legal.
O contrato foi assinado em 01/04/2012, quando o atleta estava com 16 anos de idade, sendo, portanto, assistido pelo pai, fatos estes incontroversos nos autos, não existindo a princípio qualquer nulidade, pois tinha consciência plena das cláusulas quando assim o firmou, não existindo qualquer vício de consentimento na manifestação de vontade quando da celebração do contrato, já que devidamente acompanhado de seu genitor.
Conforme acima reproduzido, a cláusula 16 é totalmente indene de dúvidas e esclarece que as partes ¿ manifestam sua vontade de estabelecer um vínculo contratual e desportivo pelo prazo de 5 (cinco) anos, permitido pelo artigo 30 da Lei 9615/98.¿ Afirma que o ajuste de 3 anos de contrato com prorogação (sic) automática de 2 anos, visava atender ¿regra imposta pela FIFA¿ e ¿obtenção de acessória condição de jogo¿.
A meu ver, referida cláusula deve ser lida diante do princípio da boa-fé objetiva que segundo Ruy Rosado de Aguiar (AGUIAR JR., Ruy Rosado. Cláusulas abusivas no Código do Consumidor. In: Estudos sobre a proteção do consumidor no Brasil e no MERCOSUL. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 1994.) pode-se definir boa-fé como "um princípio geral de Direito, segundo o qual todos devem comportar-se de acordo com um padrão ético de confiança e lealdade. Gera deveres secundários de conduta, que impõem às partes comportamentos necessários, ainda que não previstos expressamente nos contratos, que devem ser obedecidos a fim de permitir a realização das justas expectativas surgidas em razão da celebração e da execução da avença".
Apesar de o contrato de trabalho desportivo ser protegido pelas regras e princípios básicos do direito do trabalho, isto não exclui alguns princípios do direito civil, já que se amolda de regras especiais e específicas ao atleta profissional.
Da cláusula em questão, é clara a intenção em firmar um contrato com prazo de validade de 5 anos. O fato de por imposição de regras internacionais ser firmado contrato de 3 anos com prorrogação automática de 2 anos, não inviabiliza a intenção real de contratarem o prazo efetivo de 5 anos.
Até porque o atleta vem se beneficiando do contrato especial, pois caso não fosse firmado da forma em que se encontra, não poderia participar dos jogos, invialibilizando (sic) demonstrar suas condições de jogo e sua capacidade de crescimento profissional.
A lei brasileira não faz qualquer distinção entre jogadores maiores de 16 anos ou maiores de 18 anos, quando se refere à prazo contratual.
Esclarece-se ainda que apesar de o paragrafo 1º do art. 1º da Lei 9615/98 informar que "§ 1o A prática desportiva formal é regulada por normas nacionais e internacionais e pelas regras de prática desportiva de cada modalidade, aceitas pelas respectivas entidades nacionais de administração do desporto", colocando as regras nacionais e internacionais no mesmo nível de aplicabilidade, tal situação não garante a prevalência dos 3 anos, pelo fato de o réu ter assinado contrato quando menor, pois o contrato foi assim assinado para atender exigência formal.
Quanto a cláusula de prorrogação automática, a par de ser potestativa, não há como ser considerada puramente potestativa, uma vez que é bilateral, podendo qualquer das partes exercer o direito de continuidade, tanto que o jogador Thiago a exerceu, conforme fls. 59, estando o clube obrigado a aceitá-la. Pensar o contrário é autorizar a agremiação a não prosseguir com os contratos por ela firmados, se o jogador não tiver demonstrado até aquele momento o desempenho esperado, o que geraria muitas vezes um prejuízo enorme para a carreria (sic) de muitos.
Ademais, ressalto decisão correcional da lavra do Exmo. Dr. João Oreste Dalazen, nos autos de n.º 1914346-11.2008.5.00.0000, a qual utilizo parte da sua decisão, para acrescer a minha, no seguinte sentido:
"Está claro que o Requerente não é obrigado a prestar labor a uma agremiação desportiva com a qual se incompatibilizou, virtualmente, ou que, por qualquer motivo, não consulte mais aos seus interesses. Nesse caso, é-lhe lícito rescindir o contrato renovado, desde que suporte a respectiva cláusula penal, que, até como imperativo ético, é válida para ambos os contratantes, não apenas para a agremiação desportiva."
Não se descortina, pois, um quadro de irremediável comprometimento ao livre exercício de trabalho, ou de profissão.
De resto, do quanto se expôs e no que interessa aqui também não transparece desídia das instâncias ordinárias na apreciação dos inúmeros remédios processuais de que se valeu o Requerente.
Diante do exposto, esclarece-se que a concessão da tutela antecipada exige a presença de certos requisitos, materializados na prova inequívoca que convença da verossimilhança da alegação (caput, art. 273, CPC), conciliada, com o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação (inciso I) ou de difícil reparação (inciso I) ou ainda, quando caracterizado o abuso de direito de defesa ou mesmo, o manifesto propósito protelatório do réu (inciso II).
E no caso sub judice, os requisitos cumulativos indispensáveis à sua concessão previstos no art. 273 do CPC se mostram presentes, in casu, prova inequívoca a gerar verossimilhança das alegações, ante ao fato da matéria ser de direito, não necessitando de produção de provas orais e o periculum in mora, uma vez que é público e notório que o jogador pode negociar contratos com outras agremiações, quando os contratos atuais firmados estiverem para se extinguir.
Assim, em razão do exposto. concedo a liminar requerida, reconhecendo-se a existência de contrato único perante as partes, pelo prazo de 5 anos, suprindo com esta decisão, a manifestação do atleta de fls. 50/51, diante da validade concedida à clausula de renovação automática, estando portanto o contrato de trabalho especial ativo até 31.03.2017.
Acolhe-se, nesses termos.
Curitiba, 20 de outubro de 2014.
Karina Amariz Pires
Juíza do Trabalho Substituta