4 dez 2019 - 14h21

De que são feitos os ídolos?

Quando Marco Ruben vestiu a camisa atleticana pela primeira vez, já era um ídolo rubro-negro. Simples assim. E não se trata da famosa gringolatria. Alguns simplesmente nascem com isso – não sabemos o quê – que lhes torna capazes de fazer os mais céticos sonharem acordados.

Marcelo Cirino não nasceu com isso. Quando vestiu rubro-negro pela primeira vez, era apenas um menino. E quando a torcida o notou pela primeira vez, nem mesmo o torcedor mais iludido poderia sonhar – acordado ou não – com o que ele seria um dia capaz de fazer.

Por fim, no meio do caminho entre a adolescência e a experiência, trajou vermelho e preto Bruno Guimarães com a alegria que lhe é característica. Não era “de casa” como Marcelo, nem tinha devotos como o experiente Marco (exceto pelo motorista do táxi 39 do Rio de Janeiro). Não despertava sonhos – talvez porque sua missão nessa terra seja misturar o que é sonho com o que é realidade.

Três atletas e poucas coincidências.

Quando quis, Marco foi de aço, como as navalhas de Alejandro Ruben. Mas certamente o filho não poderia nunca ter exercido o ofício de seu pai. Afiado, o centro avante castigou a pele de seus mais temidos conterrâneos em duas das noites mais belas da história do Joaquim Américo. E quando a fase era ruim, o centro avante se transformou em prata e foi a bandeja que serviu os famintos Bruno Guimarães e Cittadini nas finais contra o Inter.

Marcelo foi, desde o começo, feito de pedra. Subiu muito jovem aos profissionais e pouco fez. Era consenso que ele precisaria ser talhado longe daqui. Foi para longe, mas voltou igual. Parecia que nenhuma talha seria capaz de dar uma forma bela àquela pedra bruta.

Entretanto, o artista que esculpe as obras mais bonitas do futebol teve um estalo e começou o seu trabalho no meio do ano de 2012. Pouco a pouco a pedra foi tomando forma.

A inspiração, no entanto, é traiçoeira: ela te pega no meio da madrugada e te abandona sem deixar aviso. Os anos passaram, a inspiração se foi e, junto com ela, se foi Marcelo novamente. Não seria a primeira e nem a última obra inacabada do mundo. Mas a pedra ainda teimava em não querer ser talhada longe daqui. E voltou.

Desta vez o artista não deixou a inspiração escapar pelos vãos dos dedos. Talhou até as mãos sangrarem e Marcelo, aos 51 do segundo tempo no Beira-Rio, foi apresentado ao mundo como uma das mais incríveis obras-primas do artista.

Bruno, por sua vez, foi como ouro desde o princípio. Junto com o diamante Renan Lodi, fez a jovem dupla que mais brilhou no futebol paranaense desde muito tempo. E como toda pedra preciosa que brilha aqui desde o século XVII, não demorou pra começar a ser cobiçado do outro lado do Atlântico, para onde deve ir em breve.

Mas afinal, de que são feitos os ídolos, então?

Para mim, no fim das contas, todos eles tem algo em comum. Podem cortar como aço, brilhar como a prata, resistir como a pedra ou reluzir como ouro, mas no fundo são mesmo como um frágil grafite: rabiscam no rascunho da memória dando forma às letras que contam as histórias mais bonitas. Alguns riscam com peso e deixam marcas profundas e errantes, como letras de criança. Outros riscam com leveza e precisão, deixando um traço fino e quase perfeito.

Mas, independentemente de como escrevem, eles se recusam a serem apagados: uma vez escrito, está escrito.



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