A eficácia, eficiência e efetividade de Luiz Felipe Scolari
Quando as pessoas me perguntam “quem é o Murilo?” a primeira coisa que digo é que o Murilo (ou Doc, como me chamam) é atleticano. Além disso, sou médico e atuo na área da Psiquiatria. Aqui, neste espaço, o intuito é conversar – de torcedor para torcedor – sobre aquilo que nos é cura, mas também comorbidade, loucura e uma licença poética: o Club Athletico Paranaense.
Libertadores é cruel. O Athletico está na sua oitava participação na competição andina, ultrapassou os cem gols – marca que o coloca entre os dez times brasileiros que mais frequentam as redes adversárias -, é o 11º clube nacional com mais partidas no campeonato. Com tudo isso, o Furacão há 17 anos não chegava às quartas de final. Em quatro oportunidades parou justamente nas oitavas. A última vez que deu o salto, em 2005, foi para a final com o time do santo. A história, o vexame dado pelo tricolor paulista, todos conhecem.
O Furacão fazia péssima campanha no Brasileirão – não vencia há seis jogos e amargava na zona de rebaixamento – quando o head coach foi para beira do campo. Em meio ao caos, bem cantado, o experiente comandante – já de terno e gravata – aceitou tocar o Furacão. Pegou o barco andando, fazendo água, um Titanic ao que tudo indica torpedeado pelo mau ambiente. Apagados os incêndios, escaladas as feras e reconhecidas as vulnerabilidades do elenco, a opção tática foi a tradicional: arrumar a defesa e tornar o Athletico um time que “sofria” – mas que, sobretudo, sabia como fazê-lo. Jogava-se no fio da navalha. Dava certo. Saímos do abismo, respiramos fundo. E ainda arriscamos braçadas rumo ao continente libertador.
Estou falando de Paulo Autuori, mas poderia muito bem ser sobre Luiz Felipe Scolari. E, torcedor, sabe por que deu certo – na época – e por que o triunfo se repete agora? Porque Autuori e Felipão entenderam o dilema atleticano; os jogadores compraram suas ideias; os planos táticos variam de jogo para jogo – para cada batalha um esquema. Não é sorte, é experiência e conhecimento. Bases firmes para o sucesso – que no futebol às vezes de nada adiantam – adiantaram e muito.
Aliás, sorte é o reflexo de uma série de elementos: determinação, conhecimento, persistência, habilidade, competência, disciplina, foco e compromisso. E para que os objetivos propostos pelos comandantes se concretizassem na prática, o time necessitaria de qualidades e características sempre muito citadas e destacadas por Autuori em seus discursos: eficácia, eficiência e efetividade.
Os experientes treinadores salvaram as temporadas do Rubro-Negro ao identificarem a vulnerabilidade do elenco, a crise comportamental e criado um esquema que conseguiu os resultados para a sobrevivência. O presente repete o passado e o Athletico, hoje, está entre os oito melhores do continente.
A concordância dos comandantes em assumir o cargo para o qual – a princípio – não seriam contratados, suas habilidades em contornar a desarmonia, entender os limites da equipe e usar uma forma de jogar muito distante do que se afirmou em certo momento como o jeito de jogar atleticano, foram essenciais.
Você quer ter razão, ou quer ser feliz? Pergunto ao torcedor rubro-negro: “você quer jogar bem e estar lá atrás na classificação; ou jogar mais ou menos e estar na vice-liderança do campeonato e classificado nos “mata-mata” das competições que disputa? Um ou dois? Dois. Sem dúvida, dois.
O atleticano está aprendendo a defender. Num momento sopra o balaço vindo de fora e a bola passa por sobre o travessão. Estica o pé e corta o cruzamento perigoso. Vira grama e amortece o chute à queima-roupa. De cabeça afasta a bola aérea ameaçadora. Entre ações defensivas, lamenta os passes errados na saída de bola, na intermediária, no lance final dos contra-ataques. Na poltrona, as frases se repetem: “vi lá dentro esta bola”; “quase que a casa cai”; “nem um lancezinho de ataque”; e com as mãos suando e a boca trêmula, “lá vem os caras de novo”.
Mas para avançar na competição, o Athletico tem um trunfo no banco de reservas: o técnico Felipão – que nunca fora eliminado antes das quartas de final. Scolari disputou, ao longo da carreira, sete Libertadores, tendo como piores campanhas as quartas de final em 2001 (com o Cruzeiro) e 2019 (dirigindo o Palmeiras). Não será o Athletico o responsável por manchar currículo tão vencedor. Missão cumprida, parabéns, amado Furacão.
“É um momento indescritível. Foi um dos momentos mais fantásticos da minha carreira no futebol. Eu quero ficar na história do Furacão, sim, porque o Furacão está sendo uma equipe que está me dando uma alegria muito grande na vida”.
DON LUIZ FELIPE SCOLARI, pentacampeão mundial. pic.twitter.com/D8ptPsTbBI
— 𝘿𝙊𝘾 (@MuriloDziecinny) July 6, 2022
A noite também foi especial para um rubro-negro em específico, já que é um torcedor que atua dentro das quatro linhas e que honrosamente defende nossa meta: Bento. O arqueiro do Furacão completou seu jogo de número 50 atuando entre os profissionais. Desde sua estreia como titular – também nas oitavas de final da Libertadores, diante do River Plate, em 2020 – o goleiro demonstrou muita qualidade, segurança e competência e tem sido um dos destaques deste embalado Athletico. Nível de atuação altíssimo, sendo decisivo e fundamental em clássico e em Libertadores. E se tem piá do Caju fechando o gol lá atrás, na frente há outro escorando gol de classificação internacional histórica. Brilhou, também, a estrela de Rômulo.
A conclusão de tudo isso é que para que os planos pudessem dar minimamente certo, para que o Club Athletico Paranaense aparecesse em segundo lugar num acirradíssimo campeonato nacional, encaminhado às quartas de final da Copa do Brasil e confirmado entre os oito melhores da América, faltavam-nos três coisas, acompanhadas de quem entende de bola: a eficácia, eficiência e efetividade de Luiz Felipe Scolari.