16 ago 2022 - 20h30

Inferno de verdade

Quando as pessoas me perguntam “quem é o Murilo?” a primeira coisa que digo é que o Murilo (ou Doc, como me chamam) é atleticano. Além disso, sou médico e atuo na área da Psiquiatria. Aqui, neste espaço, o intuito é conversar – de torcedor para torcedor – sobre aquilo que nos é cura, mas também comorbidade, loucura e uma licença poética: o Club Athletico Paranaense.

 

Vamos direto aos fatos: a derrota por cinco tentos, no último domingo, tem zero repercussão no jogo da quarta. E me agarro ao sábio provérbio que tantas vezes vi se realizar: “dia de muito, véspera de nada”.

A principal preocupação do Athletico, no primeiro jogo da decisão, frente ao Flamengo no Maraca, foi trazer um bom resultado para Curitiba. Ponto. Um empate ou uma derrota pelo placar mínimo poderia ser considerado bom resultado. Assim sendo, o zero a zero teve gosto de vitória. O que não poderia acontecer era a repetição do desastre ocorrido contra o galináceo mineiro no ano passado – quatro a zero em Minas para acabar com a história. Pois bem: Felipão segurou lá. Agora, nós garantimos cá. Promessa de torcedor.

A esperança não é um sentimento que surge do nada. Ela é despertada e tem força vital em fatos que já ocorreram. Não é coisa só sentida, é concreta. A história se repetirá em Curitiba. Lembre-se da vitória de dois a zero contra o time do Zico em 83 no Belfort Duarte; do empate na Vila Capanema na final desta mesma competição em 2013; do empate na Baixada na Copa que consagrou campeão o Furacão em 2019 – com a passagem de fase conquistada posteriormente no Maracanã, nas penalidades; passaporte para o título.

O jogo é psicológico, exige a mentalização dos movimentos a realizar antes da partida, o controle emocional, a confiança absoluta na capacidade de conseguir a classificação, jogar os noventa minutos com igual intensidade, não desistir por um instante. As reclamações ficam para o pessoal do banco, para o Felipão na entrevista. Aliás, Scolari já tem o seu amarelo garantido. Não tem problema.

O Athletico que optou pela defesa atingiu seu objetivo. Uma primeira linha de cinco, outra com três volantes à frente da área, emperraram o carro de Dorival. O empate foi excelente resultado. E agora as arquibancadas do Caldeirão começam a fazer parte dos pesadelos dos cariocas. O Furacão não tinha qualquer obrigação de jogar bonito. A ordem era jogar sem se influenciar pelo dito “inferno” (aguardem!) da arquibancada, fechando os espaços.

Ficou ruim por quê? Por que mexeu com o time do coração do analista? Por que foi contra o movimento? Por que “deu zebra”? Por que desagrada o eixo? Esquema ruim? Atuação ruim? Anti-jogo? Sorte? O time que vai pra ganhar, não ganha; o que vai para não perder, não perde e o Athletico é o criticado? Nome disso é futebol. Se a equipe do outro lado é incompetente, aí é outra história. A mídia que analisa com o viés clubista além de parcial é nojenta, vil. É chato, trágico ver uns palhaços ou torcedores travestidos de jornalistas manchando tão bela e nobre profissão. É possível ser crítico sem ser canalha… Não quer “cera” e catimba quando não favorece seu time? Vá jogar sinuca. Agora existe maneira certa e errada de se conseguir o resultado. Pode empatar, mas só se jogar bonito. Chiliquentos. Esses sim: inimigos do futebol.

O Flamengo que virá a Curitiba trará duas manchas vergonhosas, dois jogadores que deveriam ter sido expulsos, mas que estarão em campo. O juiz que não toleraria “cera” e dera um amarelo ao nosso goleiro santo (não mais Santos) ainda na primeira metade da etapa inicial, tolerou a violência – o chute carregado de ódio de Gabriel e a entrada por traz, criminosa, de Arrascaeta. Pois bem. Pior para eles que enfrentarão a maldição que partirá das arquibancadas da Baixada. Fosse o árbitro minimamente correto e o VAR – que institucionalizou a sacanagem que sempre soubemos que havia e que comprova, a cada partida, a total incapacidade da arbitragem brasileira em utilizar de modo eficiente tecnologia das mais simples – minimamente sério e menos estrábico, o Urubu viria para terras paranaenses com as duas asas quebradas.

Mentalmente o Athletico foi muito superior. Entendeu as necessidades da partida, formulou sua estratégia e não se afastou dela em momento algum. Todo o esforço defensivo, todos os bloqueios se realizaram de forma organizada, os movimentos da ave tinhosa foram seguidos de perto, anulados, uma orquestra afinada. A voz da torcida flamenguista não entrou em campo. No fim, o Mengão estava com os nervos à flor da pele e o Furacão sereno como um veterano em batalha. E fora de campo sempre é bom ressaltar a figura de Felipão, liderança tranquila em meio à tempestade. Scolari é o cara.

A incompreensível, inacreditável e bizarra reclamação da urubuzada com relação ao resultado do sorteio – que trouxe a partida decisiva para o nosso templo sagrado – mostra o temor que a direção carioca tem do fanatismo atleticano. Da sua capacidade de remeter para dentro do campo uma força tão poderosa que anule qualquer favoritismo em princípio garantido por investimentos mais que milionários. E os números mostram isso.

Agora a história é na Baixada onde coisas extraordinárias acontecem. Os cariocas disseram que fariam um “inferno”. Bobinhos… Até parece que não sabiam que aqui a gente joga dentro de um Caldeirão, que até o Diabo teme. E Felipão: seu pedido é uma ordem. Arena lotada. Entupida. Para esquentar a orelha dos urubus. Entreguemos os 40 mil. Também por nós, mas principalmente por você, Athletico. Sempre por você.

Chegou mais um grande dia. Noite para ir e vir, atacar e defender, ser preciso; o sintético é o nosso chão, não dá para errar. Óbvio que Luiz Felipe tem seus feitiços para depenar a ave agourenta. Mais que jogar, competir e classificar. Respeitar o adversário. Atenção a cada passe. Risco mínimo. E você, torcedor, tem que estar lá para torcer – nosso único e verdadeiro ofício.

O Athletico já tem na bagagem o título da competição, nela já passou todos os horrores. Sabemos que o jogo é bruto, mas o triunfo virá, com sangue, suor e lágrimas, e será noite justa, linda e memorável. Aqui, da minha trincheira, já estou mandando todos os meus pensamentos positivos para Baixada, para o Furacão de tanta história. Na verdade, minha alma já está lá, vestida em rubro-negro, com a camisa jogadeira, pronta para ser beijada a cada minuto. E assim vamos todos, com garra e com raça, mostrar para o Brasil e para o mundo o que é inferno de verdade.



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