29 ago 2022 - 21h09

Hoje o sono não vai vir

E não tem nada que você possa fazer a respeito.

O sono não vai vir porque você conheceu o quase, e o quase é uma das dores mais desgraçadas de se sentir. É um dos motivos pelos quais você e eu temos tanto medo de sonhar, às vezes. Sonhar, você sabe, custa caro. Você investe sua moeda mais preciosa no sonho, que é o seu tempo. Horas, dias, anos, uma vida inteira, e talvez você nunca realize. Quando o sonho encontra o quase, então, a dor dilacera.

Mas o sono também não vai vir por outro motivo. Não vai demorar muito e você vai lembrar que o quase escreveu à caneta algumas linhas que você vai ler pro resto da sua vida. E aí vai ficar claro que o quase não pode nunca ser motivo de medo. Lembra aquela história de “não temer a própria morte”? Morre um pouco quem vive o quase. Morre tudo quem tem medo de vivê-lo.

No quase tem as memórias de um menino ou uma menina que, hoje, é uma pessoa adulta. No quase houve a companhia de alguém que não está mais aqui. No quase teve o improvável e o impossível, e você atravessou os dois de alguma forma.

Amanhã, aconteça o que acontecer, a Arena vai se despedir desta Libertadores. Você e eu não sabemos o que vem depois. Pode vir o quase, ou pode vir o que mora além dele. A minha única certeza, e eu acredito que sua também, é que quem estiver lá dentro da Baixada não pode estar quase lá. Este é o único quase inadmissível. Quem for, tem que ir inteiro. Pela criança que viveu o quase. Pelos que não tiveram a chance de viver outros quases. Pela fé e pela força de atravessar o impossível e o improvável.

Foi isso que te trouxe até aqui no fim das contas, não foi?

Então esquece, o sono não vai vir. Você começa a viver o dia de amanhã nesta noite, com memórias, ternura, raiva, saudades e tudo o mais. E quando você levantar, que se foda se um quase te espera. Vai que ele decide que esta vez não é a vez dele?



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