17 out 2022 - 19h31

Vida longa ao Guarani das Araucárias

Quando as pessoas me perguntam “quem é o Murilo?” a primeira coisa que digo é que o Murilo (ou Doc, como me chamam) é atleticano. Além disso, sou médico e atuo na área da Psiquiatria. Aqui, neste espaço, o intuito é conversar – de torcedor para torcedor – sobre aquilo que nos é cura, mas também comorbidade, loucura e uma licença poética: o Club Athletico Paranaense.

 

Era uma vez treinador gringo que sonhando em vencer tradicional rival economizou meios contra adversário importante, tomou três no primeiro tempo, perdeu, e para a desolação de seus torcedores – melhor dizendo, para o choro soluçante de seus torcedores – foi derrotado também, jogando em seus domínios, na sequência, para o coirmão que pretendia derrubar. Mico histórico. Para quem não lembra, a história do ATLETIba do primeiro turno foi essa.

Assim falou Gustavo Morínigo, treinador do rival, na época: “o Atletiba é um campeonato à parte. Temos que fazer de tudo para ganhá-lo”. O racional Felipão trouxe a realidade que muitos preferem não ver: “para nós, o Atletiba é mais um jogo. Queremos ganhar os três pontos”.

Quem estava certo? Felipão, não há dúvida. O resultado – de ontem ou de junho deste ano – como fato histórico só influencia de imediato no sentimento de arquibancada. A sua repercussão de classificação só ganhará significado definitivo quando as coisas forem resolvidas no final, para o bem ou para o mal.

O episódio beirando ao bizarro mostra o quão importante é para o rival um bom resultado em clássico. Jogar fora três pontos possíveis para aumentar a chance de três pontos mais à frente só pode ter base no imenso valor que se dá ao adversário em vista. O reconhecimento é para nós uma honra. E então você terá perdido seis pontos em sequência, aproximar-se-á do Z4 e a crise – tão frequente pelos lados do “Alto da Glória” – estará instalada. Uma pena.

Pensava eu que se o Furacão fosse para a partida colocando de lado o emocional gerado pelo clássico – e, principalmente, pelo maior jogo da nossa história que se aproxima e que o rival jamais experimentara sensação minimamente similar -, jogar com inteligência e sem destemperos, teria ótima chance de se manter no topo da tábua de classificação. O Athletico tem mais opções, ajusta-se a cada partida, é melhor, tudo leva a bom resultado. Só não poderia transformar o jogo em guerra. Foi numa pelada dessas que perdemos o General Heleno por meses. Assim, rumei à Baixada de sangue doce. É futebol, mas a análise fria dos fatos e números informava: era noite de Furacão.

Muitas vezes, antigamente – e o amigo e a amiga bem lembram -, era assim: o Furacão dominava e dominava. Perdia gols e perdia gols. E, daí, com o jogo tomando o rumo do final, o rival verde e branco frustrava as suas ilusões. E vencia. Quantas vezes os atleticanos praguejaram contra a injustiça da bola. Ignoravam que no futebol não existe o justo ou injusto. Existe o fato, que é a realidade.

Mas, com o tempo, o Athletico foi mandando o “verdão” para a sua dura realidade: a definitiva certeza de que o campeonato que disputa é contra o rebaixamento.

Com toda a supremacia técnica e tática rubro-negra, com o grandioso Bento fazendo milagres lá atrás e Alex Santana mostrando ao treinador que deve ser titular no Equador, vieram os três pontos. Ninguém lesionado. Alguns atletas suspensos terão merecido repouso na próxima rodada. Foi um domingo dos sonhos. Semana cheia para trabalhar. O foco total, agora, deve ser no Energético.

Há muito tempo perdi o interesse pelo Guarani. Os rumos entre o nosso Furacão e a equipe verde se distanciaram, as grandes competições, os maiores títulos passaram a ser rotina no Athletico e o eterno rival foi morar na segunda divisão. Uma dureza de doer a alma.

Nos últimos tempos, tenho percebido que o nosso amado Rubro-Negro campeão se tornou uma espécie de âncora para a torcida em sofrimento. Vivendo imensas dificuldades de todos os tipos – especialmente as financeiras – o torcedor cansado, num último alento para mostrar vida, resolveu dar pitacos no rubro-negro que lhe faz sombra, fazer comparações que beiram a psicose, criticar o planejamento campeoníssimo e a escolha de treinadores, como se alguém com trânsito prolongado pelo circuito Chapecó – Ponta Grossa – Maceió, pendurado na praça, tivesse algum crédito para dar aula de bons hábitos administrativos. E, por óbvio, comparam títulos conquistados em campeonatos suburbanos – não exageremos, alguns chegaram a incluir Londrina em seus itinerários – com os grandes campeonatos nacionais, continentais e internacionais que ornamentam a galeria de troféus do Furacão multicampeão.

Acho natural, embora a inveja evidente não seja traço positivo de caráter que se possa elogiar. Mas entendo. Entendo e acho graça. E com pesar, parabenizando com atraso os cento e treze anos do clube e com o coração irrigado pela seiva bondosa da compreensão, desejo não sucesso, mas vida longa ao Guarani das Araucárias.



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