Libertadores, estamos chegando
Quando as pessoas me perguntam “quem é o Murilo?” a primeira coisa que digo é que o Murilo (ou Doc, como me chamam) é atleticano. Além disso, sou médico e atuo na área da Psiquiatria. Aqui, neste espaço, o intuito é conversar – de torcedor para torcedor – sobre aquilo que nos é cura, mas também comorbidade, loucura e uma licença poética: o Club Athletico Paranaense.
Claro que estamos tristes. Não é sobre cair de pé ou tentar achar razões para que a dor possa ser anestesiada ou, no mínimo, amenizada. Eu estive em Guayaquil e escrevo este texto ainda sob a necessária aura de emoções contraditórias que tomam um pensamento que tenta, na maioria das vezes, ser deveras racional.
Toda derrota traz consigo uma carga imensa de frustrações, mas deve servir para uma série de reflexões que possam vir a ser úteis para um futuro próximo e grandioso que repetirá o sucesso incontestável do presente e destes últimos quatro anos dentro e fora das quatro linhas.
A gente ainda insiste em exigir uma perfeição que jamais – repito, jamais – será encontrada dentro de um esquema tático proposto por qualquer técnico de futebol. E é bastante simples (e extremamente óbvio) a razão do pensamento que exige o ideal ser pueril, inocente: o humano erra.
A intenção desta reflexão é fazer o amigo e a amiga perceberem que, por mais treinos que sejam executados, por mais táticas que sejam exaustivamente aperfeiçoadas, aqueles guerreiros dentro de campo errarão. Invariavelmente. Muitos jogos, muitas decisões e muitos campeonatos podem e serão decididos muito pela capacidade em se saber explorar as vulnerabilidades dos adversários. Na maioria dos casos de sucesso, aquele que ganha assim o faz não porque acerta mais, mas porque erra menos.
O Flamengo não foi tricampeão continental antes, pois um vacilo do na época rubro-negro Andreas Pereira permitiu ao Palmeiras (bicampeão, eliminado este ano pelo nosso gigante e amado Furacão) aproveitar a chance e levantar o caneco. Infelizmente, este ano foi a vez de outro rubro-negro falhar, mas do lado paranaense: Pedro Henrique acabou cometendo duas faltas que culminaram com sua expulsão. A consequência vocês sabem.
Abro as redes sociais e o ódio direcionado ao atleta toma conta do sentimento do torcedor. É compreensível, pois se fosse diferente, talvez o desfecho do campeonato também o fosse. Mas com convicção, afirmo: as dificuldades continuariam a acontecer, só não seriam as mesmas. Errar o zagueiro não quis. Ninguém, em sã consciência, quer prejudicar sua equipe. Aconteceu. E foi num momento decisivo. O doloroso desfecho desfavorável vocês também já sabem. E não saberíamos dizer como seria se o zagueiro permanecesse em campo.
Meu verdadeiro propósito ao escrever estas breves palavras não é a lamentação, pelo contrário. É a gratidão. Gratidão ao Club Athletico Paranaense por proporcionar a nós a possibilidade de disputarmos mais uma final continental. Gratidão por permitir a quase 50 mil torcedores desfrutarem de um encontro coletivo inesquecível em nossa casa/templo sagrado. Gratidão de poder estar entre aqueles poucos que acompanharam, de pertinho, a escrita em letras prateadas de mais um capítulo muito bonito da quase centenária história do maior do Paraná. Gratidão a Luiz Felipe Scolari que deu vida a elenco a princípio desacreditado e o coordenou à finalíssima; lembremos que toda uma torcida estava desiludida quando o nome de Felipão para o comando técnico foi anunciado.
Perdemos. Estamos tristes, alguns desolados. Mas que orgulho! É interessante sair do palco da final e, ao conversar com torcedores adversários, constatar que “jogamos de igual para igual”; ou que “perdemos no detalhe”. A sensação que fica é a de que não serão necessários mais dezessete anos para que a Glória Eterna tenha como concorrente derradeiro El Paranaense.
Parabéns aos cariocas. Erraram menos. Aproveitaram as chances criadas. São campeões com todos os méritos. Cumprimos com o nosso dever nas arquibancadas: apoiamos, incondicionalmente. E sofremos, quando o irreversível último apito colocou fim na disputa de melhor da América no ano de 2022. Mas quer saber… não pararemos por aí. O ponto final da campanha internacional só é a continuidade de um projeto de sucesso e que – ano após ano – tem se mostrado altamente eficaz e vitorioso. Sinceramente, eu não vejo que aqui foi o fim ou que o ocorrido represente o fechamento de uma história. Minha esperança reside no fato de que o vivido no sábado continua já na próxima quarta. De que este capítulo grandioso da história do nosso clube termina com necessárias reticências…
Então, vamos juntos. Mais uma vez. Como sempre foi e deve ser. Levantar a cabeça e lutar pela nossa obsessão. E esta luta não começa depois, com um novo planejamento, num novo ano e com novas perspectivas. Isso se inicia agora. Contra o Goiás, no Brasileirão. Nossa maior comorbidade precisa de você, desde já. Porque são os próximos jogos que definirão os candidatos à Gloria Eterna do próximo ano. Vamos, vamos, torcedores. Vamos lutar por mais uma Copa Libertadores! O futuro depende dos resultados do presente.
Hoje, não choramos mais pelos reveses. A emoção que faz transbordarmos em lágrimas ocorre nas vitórias. Isso é sintomático. Choros de raiva, desabafo, extrema tristeza e frustração não são mais a rotina atleticana. O gigante Furacão hoje briga na frente em todas as competições que entra para disputar. É nossa missão – dirigentes, jogadores e torcedores – manter isso. Voltar para trás, nunca mais.
A dor da derrota é passageira; o orgulho de torcer para o Furacão é eterno. Muito mais que ganhar ou perder. Muito mais que acompanhar um time. Fazer e ser parte da história é especial. O grito ainda ecoa na mente e deve, sempre, reverberar no coração: Libertadores, estamos chegando.