Sí, se puede
Quando as pessoas me perguntam “quem é o Murilo?” a primeira coisa que digo é que o Murilo (ou Doc) é atleticano. Além disso, sou médico e atuo na área da Psiquiatria. Aqui, neste espaço, o intuito é conversar – de torcedor para torcedor – sobre aquilo que nos é cura, mas também comorbidade, loucura e uma licença poética: o Club Athletico Paranaense.
A partida do último sábado, pelo Brasileirão, foi daquelas de enervar. Mas todos sabíamos que seria assim. A vitória, o tabu e os três pontos escorreram pelas mãos. No momento que mais era preciso, as cabeças não funcionaram e o lance mortal aconteceu. Um a um amargo contra o Peixe de Paulo Turra, demitido após o resultado. Passa a régua.
Ainda falando de passado, sobre a derrota nas alturas, cabe pensar mais demorado. Sair atirando contra alvos expostos pela adversidade, nas vésperas de encontro em que tudo se decidirá dentro do nosso templo é, no mínimo, dar tiros no próprio pé. Além da natureza que transforma onze em quinze para o lado boliviano, os males rubro-negros que facilitaram o resultado negativo são recorrentes e muito dificilmente serão curados a curto prazo. Um retorno ou outro poderá alavancar setor, o grupo experiente deverá ajudar na formação do onze a iniciar a batalha, evitar o erro cometido na vontade de descobrir solução empregando o menos qualificado.
Wesley pode filosofar à vontade, fortalecer o grupo na palavra, mas… Tem que olhar e perceber. O Athletico e o torcedor precisam confiar nele. As críticas, deixamos para depois. O professor tem as armas para a conquista; a oportunidade que o clube lhe dá é dádiva – ele precisa fazer algo melhor. Fomos longe ano passado, somos vice-campeões da Liberta. Eles nos respeitam.
A diferença de dois gols trouxe o Furacão baleado para Curitiba, mas vivo, respirando sem necessidade de aparelhos – aqui, nosso oxigênio não permite desigualdades. Você, torcedor, tem que acreditar. Este Athletico de 2023 já virou jogos (oito, neste ano) muito mais difíceis, com escassos minutos para remontar. Agora, temos noventa minutos para fazer o resultado. Deixe as lamentações de lado e acredite. Seja um rubro-negro de fé. O que não podemos é vestir o terno agourento do pessimismo. O Athletico precisa virar uma disputa. Provavelmente, empatá-la já seja suficiente – com a diferença de dois tentos, nos penais a gente se garante. Os Deuses futebolísticos vestem rubro-negro no momento da decisão.
O Athletico terá certamente a sua força máxima. Necessita acertar a pontaria. O empate em Santos, nos minutos finais, deixou um gosto ruim na boca; a eliminação na Copa do Brasil amargou o chope. Chegou a hora de fazer grande partida, consistente, dar certeza ao torcedor de que a Libertadores está ao nosso alcance. Vamos com tudo. Chás de limão, anis estrelado, romã, devem ser consumidos aos litros, a garganta tem que estar em ponto de bala. E nos vemos na Arena. Vamos todos juntos, liggados na mesma emoção; vencer, porque este é o nosso dever.
Estou torcendo por você, Wesley. O gol rubro-negro na Bolívia nos deu imensa vantagem, mas forçou o adversário a atacar, morar no nosso campo de defesa. Nós não soubemos foi aproveitar a vantagem. Isso porque o Athletico tem no seu DNA recente o “zagueiro zagueira” – viu a bola na frente dá logo um balão, resolve o problema defensivo, não consegue construir nada no ataque; volta a pressão; e a pressão contínua leva ao erro, aos gols da virada. Você tem Fernandinho no meio de campo que é garantia de transição bem-feita; precisa que a tranquilidade do craque irradie para os demais volantes e armadores; que a bola seja trocada e o contragolpe eficiente agrida constantemente o adversário, crie a intranquilidade – ela é vetor de erros, nervosismos, que inexistem quando você está somente enfiado dentro da sua grande área.
O Athletico tem uma legião de fanáticos que bem entende as flutuações do combate, sabe que tem que ir à Arena para apoiar, tornar o que é difícil fácil. Dia, mais uma vez, de apoiar. É noite de Copa. Nada está definido. E vamos de novo, com a fé de soldado novo, ainda acreditando que melhor o comandante que chega com sangue nos olhos, que senhores com a alma corrompida pela ganância e o desamor.
Terça é dia da tropa fanática estar cedo nos arredores do Joaquim Américo, para ir esquentando a voz, atiçando o fogo do caldeirão. E sem chiliques. Quando o telão anunciar os onze escalados, é assimilar o grupo e aumentar o grito – para cada um o mesmo apreço, o mesmo incentivo, a mesma força. A arquibancada precisa operar a 100%, sem descansos. Você fará a sua parte. A torcida será o fenômeno de sempre – linda, cantante, cruel, à luz da lua, com o retrátil aberto. “Vamos, vamos, jogadores…”. E repete. E assim vão mente e voz até o final da noite.
Se o torcedor recordar a angústia profunda que invadiu cada um de nós após o segundo gol do arquirrival, na Baixada, pelo campeonato nacional, vai concluir que o momento era de largar os betes. O mesmo sentimento pode ter existido antes das outras sete viradas que o time empreendeu ao longo da temporada. Mas vai lembrar que nenhum de nós arredou pé. Sentiu-se o golpe, abrandou-se o canto, acendeu as mentes em desânimo e o brado voltou a ecoar forte na atmosfera da noite encantada.
Sim, se pode. O atleticano histórico viveu isso, sobreviveu aos piores momentos, viu com os olhos que a terra há de comer os quatro gols do Ziquita; viu pênalti em prorrogação de final de Sulamericana ganhar o rumo das caveiras. Sim, se pode. O atleticano sabe disso, luta por isso, vencerá por isso. Esse, irmãos, é o nosso destino manifesto. Que ninguém duvide. Afinal, “quem quer passar além do Bojador, temque passar além da dor”. O caminho para Glória Eterna passou por La Paz. La paz que nós, rubro-negros, conquistaremos ao final da noite de terça-feira. Se lá nos faltou pulmão, aqui nos sobrará coração. Sí, se puede.