A arte da expectativa
Tudo na vida é expectativa. Essa semana, me mudei para outro país e me notei sentindo mais irritadiço com mais facilidade. Depois de muito pensar, entendi que a ausência de rotina amplifica isso. Você não tem um piloto automático, então tudo é pensado, oneroso, requer constante atenção. Vendo Athletico x Juventude, entendi que o Athletico de 2024 é igual. Descrevi esse plantel semana passado como “cheio de entropia” e o impacto real disso é ver um time que não segue a ordem natural das coisas. Toma gol quando está melhor, acha gol após tomar gols frustrantes. Não há uma ordem natural das coisas. Perde em casa, ganha fora, acha gols de ar rarefeito, toma gols de pelada de domingo. Não há tranquilidade em momento algum para o espectador.
Tem uma frase do cronista esportivo Bill Simmons que ecoa na minha cabeça há meses. Parafraseando e traduzindo: “Os melhores times são como cachorros. São mais divertidos enquanto filhotes, mas os momentos mais memoráveis vem quando já são velhos. Quando perdem um ou dois passos, mas você já os conhece melhor do que conhece qualquer outra coisa”. O modus operandi do Athletico nunca nos permitiu ter o cachorro até ele ser velho o suficiente para apreciar. O mais próximo disso que chegamos foi em 2019, quando seguramos um time campeão e você ia na Arena sabendo que o time faria 2-3, talvez 4 em adversários mais fracos.
O Athletico de 2024 me parece na primeira fase de filhote. 2023 foi uma ressaca do mágico 2022, que até hoje perdura na cabeça do torcedor. 2024 é um time com caras velhas sendo lideranças novas. A própria capitania Athleticana ilustra isso: já passou por Erick, Christian, Canobbio. É questão de tempo até vermos Cuello capitão. As únicas expectativas certeiras que temos hoje em dia são negativas. Escanteio para nós é nulo. Escanteio pro adversário é perigo certo. A cada contra-ataque se perdem dias, senão semanas, de expectativa de vida. Todo jogo tem gol na nossa meta.
O próprio plantel Athleticano não sabe o que esperar. Se você pegar os grandes cases do Brasil recentemente, são trabalhos longevos. Vojvoda, Abel com quatro anos de casa cada. Caixinha, Ceni com mais de um ano de cargo mesmo com períodos voláteis. Quem joga bola nesses clubes sabe que independente do resultado de domingo, vai ter o mesmo chefe na segunda. Os que têm variância no treineiro, tem estabilidade e plano de carreira pros jogadores, caso do Botafogo e seu intercâmbio com a Europa. O Athletico? O Athletico tem Kaique Rocha querendo sair, Christian com o empresário postando nota de assessoria via repórteres para cavar interesse. Na ausência de constância, cada um cria suas expectativas e age para tentar atingi-las.
O grande problema nasce dela, o grande tema da coluna: a expectativa. O centenário foi vislumbrado por anos pela torcida e também amplificado pelos cartolas do clube. A promessa original do Petraglia de ser campeão do mundo até 2024 não era por acaso. Era uma ambição acima de tudo amarrada de uma narrativa. Havia futuro e havia uma data para o torcedor esperar ele chegar, abraçado na sua fé. E como um culto daqueles de fim do mundo, todos esperamos e vimos o relógio bater meia-noite e… nada mudou. O mundo continuou aqui e nós continuamos iguais.
Hoje eu não duvido que o Athletico seja capaz de ganhar de qualquer time do Brasil. Tenho certeza que ele é capaz de perder para qualquer time do mundo. É acima de tudo, a soma de partes inconsistentes. O jogador que fez gol hoje, faz partida de série B amanhã. O jogador descartado de ontem é a solução aos 80 minutos de jogo tenso. Não sei como cada peça vai atuar jogo após jogo, tirando Fernandinho, extraclasse sempre. Se você me disser que esse Athletico ganha uma copa, eu acredito. Se você me disser que cai e disputa a Série B em 2025, uma sina clássica de centenários no Brasil, acredito com o mesmo fervor (e pânico).
No fim do dia, eu só quero um Athletico do qual eu possa saber o que esperar. Hoje minhas expectativas estão esperando o pior. Afinal, quem mantém as expectativas no chão só tem um lugar para ir: para cima.