Tristeza
Nesse momento de muitas turbulências, da insatisfação da torcida, das intransigências da Diretoria e até das possíveis repercussões negativas de tudo isso no desempenho do time, preciso compartilhar algumas reflexões. Mas permitam-me antes que me apresente em poucas palavras.
Quis Deus que eu não tivesse nascido brasileira, nem curitibana, nem atleticana… Nasci bem longe desta terra, mas desde pequena, o meu pai sempre me levava aos jogos do time local. Aprendi algo sobre o futebol e muito sobre o que é torcer e amar um time. Aliás, o meu pai também amava o futebol brasileiro e o conhecia como poucos brasileiros conhecem: sabia tudo sobre a seleção, sabia de cor os nomes dos craques desde a primeira apresentação brasileira. Acompanhava os campeonatos brasileiros e discutia sobre as táticas dos times, suas formações, atuações, ascensões e quedas. Faleceu também longe daqui, mas a plaquinha com seu nome está para sempre na frente da nossa querida Arena.
Quando vim para Curitiba, um dos vizinhos do prédio onde morava era Tostão (do Coxa!). Seus filhos se tornaram amigos dos meus e batiam bola juntos – com Tostão – no Barigüi e até no Couto. E? Nada. Nenhum sentimento pelo Coxa. Cheguei a malhar numa academia, onde treinava Vavá (do Coxa!). Ficamos amigos e discutíamos o futebol diariamente. E? Nada, absolutamente nada. Nem a mínima vontade de conhecer o Couto sequer.
E quis Deus que meu filho tivesse se tornado atleticano. E um dia insistiu para que eu fosse com ele ao jogo na Arena. A paixão nasceu, instantânea e arrebatadora. Entrei na Arena para nunca mais (assim pensava) ficar longe dela. Íamos a todos os jogos, acompanhávamos (e acompanhamos) os sites do Furação e as listas de discussão. A minha sala na universidade onde trabalho (um reduto alvi-verde) é a mais rubro-negra. Comprávamos pacotes e, mesmo quando o time deixava a desejar, éramos felizes. Sofríamos, mas éramos felizes. Afinal, ser atleticano é uma felicidade, é ser feliz.
De vez em quando vou ao CT, conheço alguns funcionários e até algumas autoridades do Atlético, e, quando posso, discuto as coisas do nosso clube com eles. Pois bem. O discurso, tanto oficial como extra-oficial, que sempre ouvi e que acabou me convencendo, foi no sentido de que a rubrica, a parcela da receita representada pelos ingressos é ínfima, é desprezível. A política, a filosofia do Atlético, me diziam (nos diziam!), é descobrir e criar craques para vendê-los. Daí vem a boa parte da receita, receita essa que permitiria manter o nosso magnífico estádio, firmar convênios e, com isso, obter mais lucros. Também firmar convênios com clubes do exterior para que façam sua preparação física e técnica – científica, bem planejada – e aprendam o melhor futebol do mundo. Bela estratégia e bela receita! O Clube teria também belíssimos planos de ampliação do CT e de ampliação desse convênios para chegar a fundar uma espécie de uma Universidade Internacional de Futebol.
Quê orgulho para nós, atleticanos! Esse foi o discurso. De uma hora para outra, mudou tudo. Agora querem me (nos) convencer, justificando que a receita do Clube praticamente depende só dos ingressos! Isso, sinceramente, me faz sentir enganada, decepcionada. Isso, sem falar que me sinto profundamente ofendida pelas infelizes palavras do Presidente – um homem culto que eu respeito como respeito a todos que dirigem e se dedicam ao Clube – que, não tendo melhores argumentos, simplesmente generalizou na base de um lamentável preconceito simplista (do tipo: “os franceses não tomam banho”; “todo brasileiro é preguiçoso”, etc.) de intolerância explícita. Os argumentos de que lá, na Europa, o ingresso é caro, que a Arena é do Primeiro Mundo e que o futebol está cada vez mais caro não convencem. Aqui, a prática do ingresso caro e “dolarizado” realmente levará a uma “elitização” da torcida. Mas não é isso que ocorre na Europa! Lá, se não tem uma verdadeira “justiça social”, pelo menos existe um certo nivelamento econômico da população. Promover tal política no Brasil, onde sabe Deus quando haverá uma distribuição de renda mais justa e em números mais próximos aos do Primeiro Mundo, é querer colocar a carroça à frente dos bois!
Fico decepcionada também ao ler, principalmente nessas últimas horas, as opiniões de alguns torcedores que se rendem a essa retórica dos dirigentes e acatam placidamente os preços das parcelas mensais ( mais “picadinhas”) do pacote.
No último jogo na Arena com a União Bandeirantes, ficamos ao lado de uma família que talvez se chamaria de “humilde”: um senhor de cor com sua esposa e seus dois filhos. Os meninos estavam comendo pipoca e tomando guaraná, enquanto eu fazia os cálculos de quanto esse senhor terá que desembolsar para levar sua família a algum jogo do campeonato Brasileiro… Senti que provavelmente veria essa família atleticana só mais uma ou duas vezes no estádio, durante o Paranaense, e nunca mais… Por limitações financeiras desse senhor e as minhas. Triste.