Amor sem preço
Assistir a um jogo do Atlético Paranaense ao vivo é um patrimônio da humanidade. Todos os seres humanos deveriam usufruí-lo pelo menos uma vez na vida, no estádio Joaquim Américo, na região centro-sul da América do Sul. Ainda mais em partidas como aquela obra de arte de 5 x 0 contra o Atlético Mineiro, em 2004, o 7 x 2 no Vasco e o 5 x 4 no Cruzeiro, em 2005, ou os memoráveis 4 x 2 e 5 x 2 no São Caetano, respectivamente em 2001 e 2004. Ou ainda todos os jogos contra o São Paulo, que, apesar de todas as imponderabilidades do futebol, invariavelmente têm sempre resultado favorável a nós.
O futebol é o esporte, pra não dizer uma das atividades econômicas, que mais movimentam grana no mundo. Quando cobramos jogadores para reforçar o time, ou técnicos de renome, valorizados, pra não dizer melhor estrutura (que o clube já se esforça em manter anos-luz à frente de qualquer outro no Brasil), do que estamos falando? De dinheiro, oras! E de onde ele vem? Fundamentalmente, da massa de torcedores que colaboram com o clube em todos os sentidos: usando a marca do Atlético, comparecendo aos jogos, reconhecendo as marcas que apoiam o Atlético, comprando o pay-per-view etc. Tudo isso reverte em dinheiro, que reverte em conquistas, que atrai mais torcedores etc, completando o círculo virtuoso. O nosso Atlético é o único na região sul do Brasil, além do Inter, que está na Primeira Divisão há mais de 12 anos; além de outros seis, o único no Brasil. Tudo isso custa.
Queremos reforços no campo? Que tal oferecermos reforços na arquibancada? Não apenas com o grito, a torcida e a cobrança, mas com o que é muito mais efetivo o dinheiro, pelo qual o futebol mundial se move. Afinal, quem cobra reforços para o time não reconhece que o clube precisa de colaboração efetiva?
E cobramos de quem? Da diretoria, que participa das mesmas aflições que nós. Eu participei da campanha da chapa de oposição nas eleições do fim do ano passado. Mas não posso deixar de reconhecer que a atual gestão se esforça ao máximo pelo bem do Atlético. Essas pessoas precisam principalmente de apoio, talvez de algumas críticas. Mas quem vive de criticar o Atlético são os vários pequenos rivais e nunca vi eles terem razão.
Não é a torcida inteira quem está reclamando do aumento da mensalidade, pelo simples fato de que ela não paga mensalidade. Entre os milhões de torcedores, uma diminuta parcela pode pagar o valor justo para usufruir o privilégio de tornarem-se sócios. E, entre esses, uma parcela menor ainda é formada pelos descontentes com o aumento.
O sócio o nome já diz não é a mesma coisa que o torcedor comum. Ele é partícipe das decisões do clube e, no Atlético, tem poder de voto. É co-responsável pelas decisões da diretoria que escolheu, e, por isso, deve esforçar-se para manter as discussões dentro do âmbito administrativo do clube a que pertence, e procurar apoiá-las sempre que isso, apesar de difícil, for razoável. É isso, principalmente, que faz um grande clube a coragem de seu sócio. Não fica discutindo vinte reais discute o futuro do clube. Não se sente vítima da diretoria sente-se parte dela.
Os sócios são, portanto, parte do processo. Têm a obrigação de apoiar a sociedade a que pertencem. Diferentemente de uma empresa que visa lucros, o Atlético pertence a todos os atleticanos, e principalmente aos sócios. Mas para ser sócio não basta pagar a mensalidade é preciso ter comprometimento com o clube em seus altos e baixos. Eles não devem considerar-se merecedores de privilégios concedidos por uma diretoria populista qualquer, mas devem responder ao chamado de ajuda de líderes que são verdadeiros atleticanos e estão zelando pelos seus melhores interesses.
O sócio não adquire direitos vitalícios, mas apenas o privilégio temporário do usufruto das belíssimas e confortáveis instalações do melhor estádio do Brasil. No outro extremo, não é tampouco um consumidor de supermercado ou da quitanda da esquina, que pode ameaçar o comerciante em vista da possibilidade de comprar um produto igual em outro lugar. O CAP não é um estabelecimento comercial que tem de responder a toda e qualquer demanda do consumidor. É um clube uma instituição formada por sócios apoiadores, que decidem com responsabilidade e democraticamente o que é melhor para todos os associados.
E o melhor agora é que as pessoas dispostas a contribuir com uma mensalidade um pouquinho mais reforçada tenham a chance de fazê-lo em vista da provável diminuição das filas de espera para adquirir cadeiras. Talvez o clube tenha cometido um erro ao construir um estádio em que apenas 40.000 pessoas de cada vez (e não 7 bilhões de seres humanos) têm o maravilhoso privilégio de assistir ao espetáculo do rubro-negro em campo. Talvez, há mais de dez anos, tenha vencido a tese de que um estádio maior não alcançaria sempre a lotação máxima, inviabilizando o pagamento das dívidas de um investimento ainda maior. Mas fizeram o possível realizável, ao invés do ideal inviável.
Queremos sair da indigência e não aceitamos pagar 70 reais? É como querer se limpar sem gastar água e sabão! Não vale pagar R$ 70? Quem decide isso é a quantidade de pessoas capazes e dispostas a pagar! Se, hipoteticamente falando, o Atlético encontrasse 25.000 pessoas dispostas a pagar R$ 1.000,00 ou até R$ 5.000,00, isso não seria ótimo? Não seria inteligente e nobre permitir que essas pessoas tivessem a oportunidade de colaborar com o clube, adquirindo sua cadeira? Ou a diretoria deveria insistir em manter a mensalidade a R$ 50 só para manter privilégios de antiguidade e o favor de uma massa de manobrados, como fazem alguns políticos? Não. Melhor seria elevar a mensalidade àquele patamar, para tornar o Atlético muito mais forte. Nós, simples mortais, talvez tivéssemos de nos contentar com raras promoções eventuais em que os ingressos para torcedores não-sócios fossem disponibilizados a preços populares. E mesmo assim ficaríamos alegres de ver o Atlético ser campeão várias vezes pela TV mesmo.
Mas, apesar de os benefícios superarem não só os 50, mas até os 70 reais corrigidos somente agora, a diretoria entende a posição dos sócios, pedindo deles apenas o que podem, sem custo excessivo, pagar. Isso porque a diretoria é formada por atleticanos autênticos, que, talvez carecendo de um pouco de carisma (uma bobagem), têm sido extremamente coerentes. Eles também são sócios aliás, votados por alguns dos demais sócios que hoje reclamam. Não são políticos que rapinam o bem público ao qual, ademais, não têm acesso. Administram os melhores interesses de um clube privado e entre esses está o melhor aproveitamento e investimento dos seus bens e instalações, vendendo-os pelo melhor preço. Corrigir a mensalidade foi, no mínimo, uma medida profilática para dificultar que alguns adversários se sintam tentados a comprar uma das nossas cadeiras só para impedir que os atleticanos compareçam.
A pior bobagem que tenho ouvido é a ameaça vazia de alguns atrabiliários de mover uma ação legal. Qual é o juiz, digamos, coxa-branca ou corintiano ou são-paulino ou outro que, não tendo sido, como nós, abençoado pelo supremo bom gosto de ser atleticano, conseguirá estimar e arbitrar com justiça o valor de assistir aos jogos do Atlético? Ademais, vivemos em uma economia de mercado, em que o clube é livre para estabelecer o preço, e nenhum juiz correrá o risco de tornar-se arbitrário e ridículo tentando revogar esse princípio supremo.
Nem um supermercado, que vende alimentos, tem a obrigação de manter o preço em época de crise. No caso de um clube de futebol, isso é muito mais óbvio. Compra quem quer. Aliás, a sociedade de qualquer clube é sempre cara, porque é um item supérfluo. Mas quem é atleticano de verdade apoia o seu time. O CAP precisa de sócios, não de consumidores.
Alega-se que o aumento de 40% foi abusivo. Não, não foi. O plano Sócio-Furacão, quando lançado, foi evidentemente promocional, comprovado pelo fato de que todas as cadeiras se esgotaram rapidamente, impedindo que muitos interessados pudessem adquiri-lo. Há muito poucos ingressos para os interessados que não são sócios, devido exatamente ao número de pessoas que preferem ter uma cadeira permanente.
A única possível objeção seria ao momento em que foi feito. Talvez, politicamente, o Atlético devesse ter programado melhor a época do reajuste provavelmente mais cedo, devido aos déficits que o clube já enfrenta há tempos. Mas isso mostra que os dirigentes são corajosos, porque não esperaram demais, talvez por um clima psicológico efemeramente mais favorável para fazer o que era absolutamente necessário.
Mas o mais importante de tudo é que não haverá queda de apoio ao rubro-negro, e acredito que nem de público. Se as desistências de alguns infelizmente se consumarem, não poderão continuar torcendo ao vivo regularmente, no estádio. Mas certamente continuarão se alegrando ou sofrendo pelo Furacão em casa, pela TV ou pelo rádio, ou nos bares e outros lugares que oferecem a imagem do jogo. Eventualmente, é claro, voltarão ao próprio estádio, como torcedores comuns. Mas deverão ser gratos de que outros, pessoas que temporariamente estão em melhor situação financeira, poderão contribuir com um valor um pouco maior para que o time tenha mais chances de alcançar os objetivos comuns a todos nós: os títulos e glórias a que todos estamos acostumados. Ser o raro privilegiado, entre a inteira massa atleticana formada por milhões de pessoas, que, além de morar em Curitiba, encontra tempo e dinheiro para acompanhar todos os jogos no estádio, certamente vale o preço.