Crônica do líder sem carisma
Ele poderia ter dormido nos braços do povo atleticano e ter acordado durante o feito magnífico de uma nova Arena Multiuso para a Copa do Mundo. Ele poderia ter sido a eterna criança guerreira que busca um caminho alternativo e conquista a vitória. Ele poderia ter feito seu nome ser ecoado pelos gramados, pelas cadeiras, pelas fileiras de sócios como um herói…
… sim, ele poderia.
Mas preferiu a solidão do argumento vazio, a cópia das idéias internacionais, a elitização do futebol brasileiro, a prepotência no trato de suas vítimas, a discórdia nos debates com os demais torcedores. Ele quis se ver rodeado pelos que nada sabem para tripudiar na cabeça dos que querem ajudar. Ele olhou para o ventre das mulheres de vida fácil e decidiu fazer nele sua concepção de vitória olhada por todos, admirada por quase ninguém…
Se não fosse ele, a Baixada não seria a Arena dos sonhos de todos os brasileiros. Mas poderia ter sido muito mais se ele deixasse a arrogância de querer ser sempre o melhor; poderia ser vista e lembrada pelos comentaristas esportivos de todo o Mundo, se a humildade fosse regra de vitória e se ao menos ele deixasse transparecer um pouco do moleque que foi quando chegou ainda menino do Rio Grande do Sul e teve que pular muros nada ilusórios do campo para ver seu time jogar…
… como muitos que não são elitizados, ele também não tinha dinheiro. Mas lá estava, entre dezenas de torcedores tentando ver seus ídolos, seu time, sua história de futuro. Este menino ainda vive em algum lugar. Precisa viver. Precisa existir. O menino é o que pode tirar do comando o Poderoso que se pensa acima do bem e do mal, o homem que se diz deus e nem acredita no milagre, na salvação, na mudança de vida.
Se não fosse ele, não teríamos títulos nacionais e ainda dormitaríamos ao lado dos times da capital. Mas foi a sacada dos que acreditam, que fez que o sonho se transformasse em realidade. Ele acreditou na realidade e fez dela uma luz. Mas faltou em seu rosto o carisma dos líderes. Faltou em sua fala, a firmeza com brandura. O endurecimento com ternura.
Poderíamos agora ter nosso nome lembrado pela façanha da conquista radical de sócios, pela mudança de postura em campo, pela torcida unida, pelos fiéis em todas as partes do Mundo buscando uma forma de acompanhar o Furacão. Ele poderia ter nos dado essa forma, mas preferiu não disputar a eleição. Teve medo do confronto por faltar nele apenas o carisma dos vencedores…
… esqueceu o menino que a conquista do chão a chão o fez forte e que de luta em luta, poderia ele ter varrido tudo, poderia ter conquistado a todos. Mas, de novo, preferiu a solidão. Fez de suas lutas a encomenda de vitórias ultrapassadas e deixou os que nada sabem fazer nada em seu lugar.
Poderia ter sido o melhor de todos os tempos. Preferiu ter seu nome apagado, escrito apenas em sites personalizados, em luta que não cabe com o para sempre propagado. Quis ficar na história, ficará apenas na memória…
E não foi por lhe faltar o brilho dos líderes. Foi por não lhe sobrar carisma. Carisma que sobrou no ex-governador Jaime Lerner, eleito e reeleito pelo povo curitibano. Amado até hoje por parcela significativa da sociedade paranaense apesar de ter sofrido tantas denúncias. Carisma que sobra para o governador Roberto Requião que mesmo em seu mais louco furor, deixa em seus olhos passar o brilho de suas piadinhas inúteis para a coleção dos que acreditam nele. Carisma que sobra no presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que por mais envolvido em denúncias, em críticas, em dissabores, não tem abalada sua aprovação, sua admiração pública, sua vocação por ter vindo de berço nada nobre… como o tão propagado menino…
Um dia, mesmo que distante, indaguei ao menino sobre o carisma que ele nem sabia o que era. Com jeito de homem forte, ele quis se qualificar como alguém carismático. Mas longe, muito longe esteve de ser…
O carisma, caro menino, é dom divino. Dom de iluminação, segundo a teologia, dado a alguns escolhidos. A sociologia prefere dizer que o carisma é fruto de uma autoridade repleta de fascinação irresistível exercida por alguém sobre um grupo de pessoas e mesmo lá, na sociologia, o dom é considerado sobrenatural. Por analogia, podemos dizer que o carisma é o conjunto de habilidades ou de poder de encantar, de seduzir, de fazer com que indivíduos despertem de imediato. Os que tem carisma conseguem a aprovação e a simpatia das massas sem precisar de poder ou de força ou de intimidação.
Todo o ser carismático é repleto de fascínio.
A palavra carisma é originária do grego (khárisma,atos) e significa: graça, favor, benefício. No latim (charísma,Átis), carisma significa dom da natureza, graça divina. Portanto, sábio menino, se não é desprovido da sabedoria que o acompanha, precisa agarrar-se ainda que tarde na graça, no favor e no benefício para alcançar ainda que ontem pudesse a história, para não desgraçar o futuro!
Urge a mudança de postura em nosso Furacão! E que ela aconteça ainda hoje, mesmo que agora, mesmo que tarde, em nossos corações!