[Promoção 86 anos do Atlético] Vivam os atleticanos!
Morava em um sítio próximo a Ibaiti. Naquele tempo, futebol era só no radinho. E só futebol de São Paulo. Os times eram Palmeiras, Santos, Corinthians e São Paulo. Meu pai e meu irmão eram fanáticos. Eu não sabia bem o que era o futebol, mas achava que tinha a ver com luta, com força, com esperteza e com heroísmo. O grito tonitruante de gol sacudia a casa em que eu morava e fazia gritar todo vilarejo. Os sentimentos estampados nos rostos eram os mais diversos. Alegria, esperança, medo, dor, desilusão. O futebol era a vida, eu não tinha dúvidas.
Mas vim morar em Curitiba. Cheguei em um caminhão de mudanças com meus pais e meus irmãos. Tinha sete anos e a altura dos prédios me assustava. Quantos carros circulando pelas ruas apertadas. Esse povo todo, será que sabia para onde ia? Nunca tinha visto tanta gente, meu Deus! Entre tantos, era possível me achar, saber para onde ir? E meu pai e minha mãe, será que eles sabiam? Eu queria que meu pai fosse jogador de futebol, como aqueles do rádio, que sem nenhum medo partiam para cima dos adversários e sempre venciam. Mas, entre tanta gente, a quem deveríamos vencer? Os inimigos… Sim, antes de mais nada tínhamos que conhecer os inimigos. E em Curitiba, aprendi muito tempo depois, Raskolnikov nos espera em cada esquina com uma machadinha embaixo do braço. Não demorou para conhecer o inimigo. A doença do pai, a falta de emprego, a comida pouca, a hostilidade ao imigrante caipira, o frio. Esse chegou em meados do meu primeiro de confinamento em uma casinha de duas peças. Foi em 1975. Nunca tinha visto neve. Minha mãe sofria a tristeza jogada em uma cama. Eu e minha irmã levantamos, colocamos uma roupa e abrimos a porta para ir para escola. Os pés, meu Deus, doiam. Estava tudo branco. Andamos cem metros. O riso abandonou nossos rostos. Os lábios arroxeados doiam. Pensamos em voltar. Quando olhamos para trás, vinha a nosso encontro um homem. Nunca fiquei sabendo quem era. Ele cobriu minha irmã com um casado e me enrolou em uma camisa vermelha e preta. Devia ter sido um anjo rubro-negro. ‘Onde está a mãe de vocês? Voltem para casa, rápido!’ A beleza daquelas cores que aqueciam o meu corpo até hoje aquece minha alma. Fiquei sabendo que se tratava de uma camisa do Atlético em 1978, quando meu irmão me levou para ver a final do Paranaense contra o coxa. Perdemos nos pênaltis, mas, na derrota em pé, tive a certeza de que o futebol era luta, era guerra, era coisa de herói. Foi nesse jogo que aprendi a cantar que só é rubro-negro quem tem sangue forte e não teme a própria morte. Atlético!