Beija-flor não é lixo!
Dia desses, eu e meu irmão saíamos cedo de casa quando nos deparamos com um beija-flor morto no meio do nosso caminho. Irritado, protestei: ‘A limpeza anda mal das pernas aqui no Condomínio. Olha isso: tem lixo no meio do caminho!’
Meu irmão me olhou espantado e observou: ‘Não é lixo, Rafael! É o corpo de um beija-flor!’. E depois de me dizer isso, tomou o corpo da avezinha nas mãos, foi até um dos gramados do prédio e – aproveitando um buraco providencial do chão (certamente não foi só coincidência, pois Ele sabe o que faz) – sepultou o passarinho, tomando inclusive o cuidado de cobrir o corpinho dele com algumas flores ‘tristes e baldias’ que no jardim havia.
Eu vi a cena e pensei comigo: ‘Em que trecho dessa estrada eu larguei meu coração?’ – senti-me pesado, tive vergonha de mim e me aborreci.
A vida não pode nos tornar insensíveis. Não a ponto de confundir o corpo de um beija-flor com o lixo!
Tentei me defender, de mim pra mim, em silêncio: ‘É o estresse, são os prazos no escritório, é o Atlético, é a fulana, é a beltrana’ mas não me convenci, tampouco me absolvi. Ao contrário.
Réu confesso, concluí que o problema era eu, eu é que me tornara um insensível. O monstro ali era eu! Mais um pouco e eu tinha chutado o corpo do passarinho do meio do caminho pro meio do gramado, como se afastasse uma lata de refrigerante.
Irremediavelmente condenado por mim, eu ia sentado no banco do carona revivendo a cena recém presenciada. ‘Não é lixo, Rafael! É o corpo de um beija-flor!’ – foi isso que o meu irmão me disse. E depois, ele tomou o corpo da avezinha nas mãos, foi até um dos gramados do prédio e sepultou o passarinho, tomando inclusive o cuidado de cobrir o corpinho dele com algumas flores que no jardim havia.
Enquanto eu reprisava a cena na tela da minha consciência pesada, via de soslaio que meu irmão dirigia na maior serenidade, como se tivesse tomado para si a leveza do beija-flor que sepultara. E eu, na condição de lixo, sentia-me sujo, como a mão que Drummond planejava cortar no poema. Desnecessário lhes dizer que tive um dia de merda!
Voltei pra casa cabisbaixo e sozinho. A cena uma vez mais reprisada na minha cabeça. Passei pela portaria e caminhei pelas calçadas do Condomínio, calçadas estas que me conduziriam até a porta do meu bloco. Antes de chegar, no meio do caminho, havia o corpo de um beija-flor.
Abaixei-me e tomei a avezinha nas mãos. Levei o corpo do passarinho ao gramado. Cavei um buraco. Lá, repousei o corpinho dele, colhi algumas flores que por ali havia, coloquei em cima do corpinho da ave – como se fosse uma coroa de flores – e voltei leve para casa, comose tivesse tomado para mim a alma do passarinho que sepultara.
E aonde é que eu quero chegar com essa história toda? Pois bem: de hoje até o final do ano, Amigo Atleticano, vai ser preciso que enxerguemos no Atlético não o lixo (no sentido de um time que só merece críticas), mas o beija-flor (no sentido de lhe reconhecer beleza, não obstante toda a fragilidade que atualmente apresenta).
E para que a gente passe a se comportar assim será necessário um esforço danado. Não importa: valerá a pena! E o esforço começa logo mais, contra o Flamengo, na Arena da Baixada, acreditando na classificação!
Temos grandes valores em campo. Que bola tem jogado o Marcinho! Que baita gigante é o Madson – ainda que a frase traga consigo um paradoxo dada a baixa estatura do valoroso atleta! Que grata surpresa esse Edigar Junio! Que alegria virá quando o Pablo estiver em campo? Que raça tem mostrado o Cleber Santana! E o que dizer de Renato Gaúcho? Caiu como uma luva, revelando-se um baita treinador, peça de que carecíamos desde Evaristo de Macedo, que treinou o Furacão no longínquo ano de 1996 (Evaristo que é, para mim, o melhor técnico Atleticano dos últimos 15 anos).
Então, Amigo, a hora é de botar as lentes do otimismo e ver as coisas do Atlético sob um prisma de positividade.
O time está evoluindo, não cairá para a Segunda Divisão (APESAR DO ‘COMANDO’ FROUXO, ANÊMICO E DISTANTE DO FRAQUINHO ‘PRESIDENTE’ MARCOS MALUCELLI)e pode muito bem ensacar o Flamengo amanhã e as paquitas no próximo sábado!
E quando tudo isso acontecer – e só depende da gente – seremos livres e leves como um beija-flor. O Atlético voltará a ser admirado e respeitado por todos, em todo canto. Afinal de contas, beija-flor não é lixo!